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Aulas por vídeo e rádio em territórios vulneráveis são tema da formação APC
Caminhos e desafios para a educação remota foram temas abordados no módulo de Planejamento do Programa Apoio Pedagógico Complementar
- José Alves
Por Marina Almeida
O módulo de Planejamento do Programa Melhoria da Educação: Apoio Pedagógico Complementar (APC) trouxe para professores e técnicos/as das secretarias de Educação possibilidades para o ensino remoto por meio do vídeo ou rádio. Érica Catalani, coordenadora do programa no CENPEC Educação, conta que a estratégia é usar o audiovisual para aproximar os/as estudantes do conhecimento.
Atuamos em um território onde há fragilidades quanto ao acesso dos/das alunos/as à Internet, aos computadores e aos celulares, fato que nos mobilizou a focar nas soluções simples para a produção de vídeos ou mesmo de áudios que proporcionem o contato do/a educador/a com o/a estudante.
Érica Catalani, coordenadora de projetos do CENPEC Educação
Ela ressalta que, durante a formação, o professor Carlos Lima, especialista em Educomunicação, mostrou o quanto esse contato é potente para a construção de vínculos afetivos, fundamentais no momento de isolamento social.
“Ele ponderou, ao mostrar as bases das linguagens utilizadas na criação de programas de rádio e videoaulas, que o mais importante é conversar diretamente com o/a estudante, conhecer seus interesses e necessidades e preparar conteúdos que possam estimular a curiosidade, a pesquisa e a investigação. Dessa forma, técnicos/as e professores/as não devem ter receio de errar ao preparar seus vídeos e áudios, pois o essencial é que sua voz e imagem encontrem os/as estudantes.”
Outras formas de chegar remotamente ao/à estudante na falta de acesso à Internet também surgiram durante a formação.
“A reflexão proposta considerou que, mesmo em regiões em que poucas famílias têm acesso à Internet, o rádio, a TV, o pendrive e o DVD podem ser utilizados para ajudar as crianças, jovens e adolescentes nas atividades impressas e aliados no ensino remoto.”
Confira a seguir uma entrevista com o formador Carlos Lima, em que ele discute as possibilidades do uso de vídeo em sala de aula, os desafios do professor nesse cenário de ensino remoto e traz dicas práticas para o trabalho docente. Ao final, leia também a reflexão de duas técnicas de Secretarias de Educação participantes sobre suas experiências com a formação.
Portal CENPEC Educação: Qual é a importância de formar professores/as na linguagem de vídeo?
Carlos Lima: A formação docente é chave para trazer uma cultura nova, a linguagem audiovisual, para a educação. Embora na sociedade ela já esteja incorporada há bastante tempo, no dia a dia de grande parte das escolas ainda é uma novidade. Portanto, faz muita diferença quando os/as professores/as aprendem a lidar com essa linguagem.
Além disso, ao trabalhar o audiovisual, entram em pauta outras questões relacionadas ao cotidiano pedagógico, como o planejamento e a roteirização de uma aula, que envolve:
Desse modo, a formação dos/das professores/as é fundamental, pois são eles/elas que criam janelas de oportunidade para descobrir maneiras melhores de construir o conhecimento com os/as estudantes.
Portal CENPEC Educação: Que dicas você dá a gestores/as e redes de ensino que desejam introduzir elementos da linguagem audiovisual na formação docente?
Carlos Lima: Minha dica é que os gestores provoquem os/as professores/as a trabalhar com propostas e projetos que envolvem a Educomunicação. Essa é uma área relativamente recente na Pedagogia, que veio justamente para aprimorar a relação dos docentes com as linguagens da comunicação. Ela se articula diretamente com propostas pedagógicas que focam na interdisciplinaridade, na participação, no protagonismo e na expressão criativa e comunicativa dos/das estudantes, em potencializar o conhecimento para chegar a mais pessoas…
Os gestores precisam encarar a Educomunicação como uma proposta da escola, que oriente os projetos dos/das docentes com os/as estudantes – como uma rádio escolar, um projeto de criação audiovisual por celular que desencadeie numa mostra de vídeos produzidos pelas turmas, um jornal comunitário, um blog ou outra rede social criada e mantida pelos/as estudantes junto com os/as professores/as para estabelecer a comunicação da escola com a comunidade.
Lembremos: a comunicação é fundamental nos dias de hoje e precisa ser desenvolvida na escola, melhor ainda quando podemos utilizá-la para promover as aprendizagens.
Portal CENPEC Educação: Tradicionalmente, o vídeo é usado nas escolas apenas como entretenimento, de forma pouco contextualizada e sem muita relação com o currículo praticado em sala de aula. Você percebe mudanças nessa forma de incluir a linguagem audiovisual na educação formal? Se sim, quais?
Carlos Lima: Eu vejo mudanças nessa maneira de trabalhar o audiovisual na educação em exemplos como o da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, que tem o Núcleo de Educomunicação, que promove a formação docente para trabalhar com cinema, por exemplo. Essa é uma oportunidade de trazer a cultura cinematográfica com esses/as professores/as para trabalharem projetos com os/as estudantes.
Vejo diferenças também quando uma rede convida e estimula os/as professores a produzirem materiais audiovisuais. Com base nessa experiência, eles/elas vão para escola e criam estratégias para promover interações e produção de conhecimento coletivo.
Trago esses exemplos para evidenciar que a formação continuada dos/das professores/as na linguagem audiovisual é a chave para essa mudança, já que muitas vezes, na formação inicial, esses conteúdos não foram contemplados. Assim, as Secretarias de Educação precisam oferecer propostas de formação, trazendo educomunicadores e especialistas que podem refletir sobre esse conhecimento com os/as docentes, articulando-os à prática. Se há alguma resistência a inserir e trabalhar com essa linguagem na educação, ela pode estar relacionada a esse aspecto. Por isso, insisto: a chave da mudança é a formação.
Em relação à formação oferecida pelo Programa Apoio Pedagógico Complementar, focamos na escolha da criação de videoaulas, pois atende a uma demanda atual dos/das educadores: trabalhar remotamente com os/as estudantes. De forma análoga ao que defendemos para os/as estudantes, ao oferecer uma formação, é fundamental observar se os temas tratados serão relevantes aos/às docentes. É sempre importante se perguntar qual será o papel de determinado conteúdo para o trabalho dos/das professores/as.
Portal CENPEC Educação: Quais são os principais desafios de formar professores na linguagem de vídeo?
Carlos Lima: Os principais desafios para o/a professor/a produzir audiovisual e, no caso, uma videoaula para formação do/a estudante são: primeiro, vencer o medo que o/a professor/a tem de uma tecnologia que ele/ela não domina tão bem. Também são desafios a objetividade da videoaula e ter de aparecer diante de uma câmera, nem sempre as pessoas se sentem confortáveis com isso. Um outro aspecto tem a ver com o medo de que essas videoaulas possam substituir o trabalho que o/a professor/a desenvolve na aula presencial. São desafios que precisam ser superados.
Nosso papel foi o de mostrar que a produção audiovisual do/a professor/a é para ajudar o/a estudante, não precisa ser cinematográfica, ter qualidade profissional. Esse/a professor/a precisa fazer o vídeo de forma simples e fácil, para ter segurança e vencer as dificuldades. É importante lidar com a produção da videoaula como se fosse uma conversa com outra pessoa, com o/a estudante. As mesmas características da conversa com um/a amigo/a devem ser usadas para tratar dos temas escolares. Seja uma fórmula matemática, seja um conceito, uma boa conversa sobre esses assuntos deve começar com sua contextualização e aí passar para sua explicação. A objetividade também é importante. Não posso fazer vídeos com o mesmo tempo da aula, de até uma hora. O vídeo deve ter um minuto, dois até cinco.
Portal CENPEC Educação: Pode indicar algumas práticas e recursos que os/as professores podem explorar com seus estudantes para trabalhar com o letramento audiovisual, seja no ensino remoto, seja no presencial?
Carlos Lima: Comece com o simples. Use o celular para a criação e captura de imagens. O headfone, que usamos para ouvir música, pode funcionar como um microfone para captar melhor o áudio.
Para a edição de vídeo no próprio celular, sugiro o aplicativo FilmoraGo. É simples de usar e pode ser um recurso útil para editar o vídeo, mantendo o que for importante e cortando o que não for. Além da produção, ele permite socializar o vídeo nas mídias sociais, nos grupos de mensagens, como WhatsApp, entre outros.
Seria importante ter alguns recursos à disposição, por exemplo, para manter a câmera estável. Quem não tem um tripé, pode adaptar uma garrafa PET. Basta fazer um corte na garrafa no tamanho do celular, na horizontal, e encaixá-lo ali. Assim você consegue ter um suporte e a estabilidade necessária na imagem para fazer a sua videoaula, além de não precisar segurar o celular enquanto grava. Uma lâmpada ou abajour é o suficiente para prover a iluminação.
Para mais dicas, sugiro visitar algumas páginas. No Núcleo de Educomunicação da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo há informações sobre vários projetos nessa área. O site da Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais em Educomunicação também traz muitas informações. Vale a pena acompanhar o maior canal de produção audiovisual feita por estudantes de escola pública do Brasil: o Henfilmes, que tem 175 mil inscritos no YouTube e mais de 27 milhões de visualizações. Os filmes são muito legais e é interessante ver como os/as alunos/as produzem audiovisual e trabalham os conteúdos. Para saber mais sobre como abordar o cinema na escola, há o Grupo Cinema Paradiso, liderado pela professora Cláudia de Almeida Mogadouro, especialista nesse tema. O site traz muitas dicas para trabalhar com filmes na escola, além de alguns planos de aula. Por último, sugiro conhecer o Minuto escola: um curso inteiro no YouTube sobre a produção de vídeos.
Para Jeanne Karla de Pilar, pedagoga e orientadora educacional no município de Pilar (PB), foi importante aprender a produzir videoaulas e programas de rádio na formação, para poder orientar os professores da rede em tempos de atividades remotas e necessidade de mais recursos tecnológicos.
Podemos falar aos professores com um pouco mais de propriedade sobre o assunto. Aprendemos que somos capazes de fazer e que esses recursos são fundamentais para o momento em que estamos vivendo. Também aprendemos que, por meio da videoaula, os alunos estarão mais próximos do conhecimento, já que seu próprio professor estará explicando os conteúdos e tirando suas dúvidas.
Jeanne Karla de Pilar, pedagoga e orientadora educacional no município de Pilar (PB)
Jeanne ainda destaca o conteúdo dos materiais recebidos sobre criação de videoaulas e programas de rádio, criação de roteiro, produção, recursos de captação de imagens do computador ou do celular e edição de vídeo.
Ela conta que em Pilar, alguns professores já vinham tentando realizar produções audiovisuais:
“A partir dos conhecimentos adquiridos na formação, com certeza, seus vídeos terão uma qualidade bem melhor e, com isso, proporcionarão melhores condições de aprendizagem aos alunos. Eles produziam, na verdade, sem a organização e planejamento adequados e agora, com base nos conhecimentos da formação, poderão utilizar os recursos aprendidos para aperfeiçoar seus trabalhos.”
Coordenadora na Secretaria de Educação de São José dos Ramos (PB), Maria da Glória Cardoso Domingues destaca o papel do rádio como veículo de comunicação democrático. “Na formação, aprendemos que as ondas eletromagnéticas permitem as transmissões em rádio sem precisar necessariamente de Internet. Trazer o rádio para a educação hoje é interessante, pois muitos jovens não usam esse veículo em seu cotidiano. Assim, o que para nós, professores, era conhecido e velho, para os estudantes pode ser uma novidade e um instrumento muito útil no contexto que estamos vivendo.”
“Além disso, o rádio permite um contato mais pessoal com os estudantes, que já conhecem a voz do professor. As aulas através desse veículo devem ser bem planejadas, para evitar repetições, prolixidade e buscar coesão e clareza nas informações.”
Ela conta que foi muito estimulante participar da formação. “A possibilidade de produzir mídia de forma simples e barata despertou em nós a curiosidade e o desejo de experimentar essas modalidades de produzir conhecimento: vamos tentar?”
Maria da Glória, que também é pedagoga e bióloga, ainda destaca a formação focada nas videoaulas:
O vídeo, ao atrelar a voz à imagem em movimento, traz ainda mais possibilidades de comunicar, expressar e produzir conteúdos aos estudantes. O professor Carlos nos mostrou que é possível produzir novas práticas educativas experimentando essas linguagens e estimulando a participação coletiva dos alunos, o que é muito interessante.
Maria da Glória Cardoso Domingues, coordenadora na Secretaria de Educação de São José dos Ramos (PB)
Maria da Glória complementa:
“A mediação entre os estudantes e o recurso das videoaulas reforça a função pública e inovadora da educação. Existem inúmeras possibilidades que contribuem para a construção do conhecimento no contexto de ensino remoto que estamos vivendo. Especialmente o rádio e o vídeo promovem a valorização e o protagonismo dos estudantes na construção de sua trajetória de aprendizagem.”
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