- Tamara Castro
No dia 26 de agosto, no auditório do CENPEC Educação, o comitê técnico de especialistas do Prêmio Respostas para o Amanhã reuniu-se para debater os 20 projetos semifinalistas, a fim de selecionar os 10 finalistas da 6a edição brasileira.
No encontro, que se desenrolou das 14h às 18h, estiveram presentes a bióloga Barbara Milan Martins, a química Flávia Cristina Gomes Catunda de Vasconcelos, a especialista em STEM Lilian Bacich e o físico Luís Augusto Alves.
Também participaram Isabel Costa, gerente de cidadania corporativa da Samsung, a coordenadora Ana Cecília Chaves Arruda e as técnicas do projeto Rubia Camaratiba e Caroline Marques da Silva, do CENPEC Educação.
Os critérios considerados na seleção dos 10 finalistas foram:
- Metodologia científica
- Relevância científica e/ou tecnológica
- Viabilidade de desenvolvimento
- Habilidades mobilizadas
- Colaboração entre os integrantes da equipe
- Caráter de criatividade e inovação
Para saber mais sobre esses critérios e sobre os pontos de destaque dos projetos finalistas, conversamos com as avaliadoras Barbara Martins e Flávia Vasconcelos.
Barbara Martins: Protagonismo juvenil e envolvimento com o entorno na busca de inovação
Olhar curioso, clareza nas informações, participação e colaboração entre os estudantes são aspectos destacados pela bióloga Bárbara Martins. Leia o que a especialista explica sobre os critérios de avaliação e confira suas dicas para a elaboração de um bom projeto científico na escola.
CENPEC Educação: Pode comentar sua experiência como avaliadora deste prêmio e como cada um dos seis critérios de avaliação foram considerados na seleção dos 10 projetos finalistas?
Barbara Martins: Sou avaliadora do Prêmio Respostas para o Amanhã desde a primeira edição brasileira, em 2014. De lá para cá, venho acompanhando as mudanças. Na edição de 2019, o destaque é a abordagem STEM na metodologia de projetos científicos.
Na seleção dos 10 projetos finalistas, consideramos seis critérios de avaliação.
O primeiro critério é a adequação aos princípios da metodologia científica. Para isso, era necessário que os estudantes definissem uma situação-problema e, por meio de procedimentos investigativos, buscassem, dentro do campo das ciências, uma solução para a questão apresentada no projeto. O que procuramos observar foi se há clareza e coerência entre os objetivos propostos, o método construído para fundamentar a pesquisa, se eles de fato se respaldaram em evidências científicas e a solução que desenvolveram. O que mais buscamos observar nesse critério é se os estudantes lançam mão de procedimentos científicos na busca de soluções para o problema. Isso inclui observar se há uma pergunta investigativa, observação, formulação de hipóteses, realização de experimentos – a depender das características de cada projeto -, análise de resultados, apresentação de dados e conclusões.
O segundo critério diz respeito à relevância do projeto. Nesse sentido, é fundamental mostrar de forma clara o quanto o projeto é significativo para aquela situação-problema. É interessante observar dois aspectos: a relevância frente ao contexto escolar e a relevância científica e/ou tecnológica. No Prêmio, consideramos a importância do projeto para a escola e para os alunos. Em relação ao segundo aspecto, relevância científica e/ou tecnológica, avaliamos o potencial dos projetos em contribuir tanto para o avanço científico/tecnológico quanto no desenvolvimento dos estudantes no sentido de se tornarem produtores de conhecimento nessas áreas. Observamos se os projetos apresentam evidências de que produziram conhecimentos científicos/tecnológicos no desenvolvimento da solução e se os produtos idealizados ou elaborados trazem contribuição ou relevância científica. Para isso, levamos em conta o contexto da escola, os materiais disponibilizados, as perguntas, hipóteses e soluções elaboradas pelos alunos pesquisadores.
O critério da viabilidade de desenvolvimento foi o que mais possibilitou diferenciar um projeto do outro. Alguns projetos apresentaram ideias muito interessantes, mas, por conta do tempo de realização, da infraestrutura da escola ou da complexidade da proposta, não conseguiram chegar a um protótipo. Então, esse critério nos permitiu avaliar os projetos que mais se aproximaram da solução proposta. Os 10 finalistas mostraram evidências de terem chegado a um protótipo, ou a um resultado importante ou a uma solução para a situação-problema focada no início da proposta. Além disso, observamos se os projetos apresentavam aplicação de conhecimentos científicos e se as soluções apresentadas eram viáveis diante da situação indicada.
As habilidades mobilizadas dizem respeito aos conhecimentos e às habilidades científicas desenvolvidas pelos estudantes ao participarem dos projetos. Nesse sentido, observamos se os alunos exercem protagonismo no projeto ou se eles apenas são usados como mão de obra pelo professor. Por meio das informações, das imagens e dos materiais disponilizados, buscamos identificar o gesto dos alunos, ou seja, evidências de que de fato eles desenvolveram o projeto e que habilidades foram envolvidas no processo. Há professores que realmente exerceram o papel de mediadores, orientadores, mas há aqueles que ainda se colocam no papel de distribuidores de tarefas aos alunos. Procuramos selecionar os projetos em que os estudantes exerceram protagonismo na proposta.
O quinto critério é a colaboração entre os integrantes da equipe. Os desafios que se apresentam no mundo contemporâneo dizem respeito a problemas complexos, que envolvem a participação de pessoas com diversos olhares, experiências e conhecimentos. O Prêmio Respostas para o Amanhã acredita que diferentes habilidades e competências dos estudantes, em conjunto, favorecem a construção de soluções criativas e inovadoras. Dessa forma, todos os envolvidos podem colaborar com o projeto e desenvolver aprendizagens significativas. Na avaliação dos finalistas, buscamos verificar se de fato houve envolvimento e colaboração entre os participantes. Para isso, analisamos os materiais disponibilizados pelos projetos, entre os quais o áudio com a fala dos alunos relatando o envolvimento de cada um no processo.
O último critério considerado é o caráter de criatividade e inovação. É importante lembrar que se trata de um contexto escolar, no ensino médio e na rede pública. A inovação pode acontecer de diferentes formas e nas várias etapas do projeto: na metodologia aplicada, no desenvolvimento de um novo processo, ou na solução apresentada. Assim, procuramos selecionar os projetos que agregaram algum diferencial ao que já existe no cenário científico ou tecnológico. Nesse critério, fiquei bastante satisfeita ao verificar que todos os 10 finalistas apresentaram aspectos de inovação e criatividade.
CENPEC Educação: Que dicas você daria aos futuros participantes do Prêmio Respostas para o Amanhã que desejam elaborar bons projetos científicos na escola?
Barbara Martins: Eu tenho convicção de que muitos projetos eram de fato muito melhores do que o que foi apresentado. No entanto, na transposição das informações para o formato escrito, muitas vezes, não transparecem a riqueza e a complexidade dos trabalhos. Uma primeira dica que eu daria aos estudantes interessados em participar do prêmio e ser bem-sucedidos é atentar para o preenchimento do formulário de inscrição do projeto. Como os avaliadores não têm a possibilidade de conversar com os participantes, toda a informação deve ser apresentada no projeto escrito. Então, é importantíssimo observar a clareza, a coerência das informações no formato escrito. Uma boa apresentação, nesse sentido, torna o projeto diferenciado em relação aos demais. Se analisarmos os 10 finalistas, todos eles têm uma ótima apresentação escrita.
Outro aspecto relevante é dar visibilidade à participação dos estudantes. Os professores devem ocupar de fato o papel de mediadores dos conhecimentos científicos/tecnológicos, que sejam realmente facilitadores do processo investigativo dos alunos. Para isso, é necessário dar autonomia para os estudantes desenvolverem os projetos. Precisamos formar pessoas que pensem, criem metodologias e soluções para problemas identificados. Os professores que promoverem o protagonismo dos estudantes na investigação certamente terão projetos diferenciados.
A fundamentação teórica também é um ponto fundamental. Os estudantes e professores devem ter familiaridade com o que está sendo produzido na área de investigação escolhida. Isso porque nunca se parte do zero, há um caminho já trilhado. É necessário trazer elementos para que o leitor saiba quais são os fundamentos do projeto, identifique os fatos, os argumentos, as fontes consultadas. As referências – livros, revistas, artigos – devem ser científicas. É necessário fazer uma boa seleção das fontes, pois muito do que se encontra na internet relacionado ao campo científico – notícias, dados – não são científicas.
Outra dica que eu daria aos participantes é observar com atenção o entorno, a comunidade. Aos professores, é fundamental despertar nos alunos o olhar curioso sobre o lugar onde vivem. Muitas vezes uma solução criativa, inovadora parte de um olhar de estranhamento sobre o que se vê todos os dias. As observações genuínas dos alunos têm potencial de desenvolver trabalhos diferenciados no campo das ciências e das tecnologias. Então, é importante desenvolver um olhar curioso, investigativo, crítico, questionador, que busca entender o porquê de certas coisas da realidade. Esse primeiro momento, de observar a vida, o território, a si mesmo, torna possível desenvolver as outras etapas investigativas.
Flávia Vasconcelos: Abordagem STEM e articulação entre campos do conhecimento científico
Por sua vez, a química Flávia Vasconcelos destaca a importância de trabalhar princípios do pensamento científico na escola. Para ela, esse é um desafio da formação inicial e continuada de professores nas áreas de ciências, matemática e suas tecnologias. Confira.
CENPEC Educação: O que se destacou nos 10 projetos finalistas?
Flávia Vasconcelos: Entre os finalistas, é possível identificar questões relacionadas ao descarte de lixo, proliferação de doenças, e a procura de soluções concretas e baratas para isso. São questões que, de modo geral, não fazem parte do horizonte de preocupações dos adolescentes. No entanto, o envolvimento do professor e a aproximação entre escola e comunidade despertam o olhar sobre esses problemas e a preocupação em resolvê-los. É perceptível que alguns professores conhecem bem o entorno de sua comunidade. Dessa forma, possibilitam que seus alunos também vivenciem a realidade da comunidade e se interessem por ela, desenvolvendo uma postura protagonista na busca de soluções para problemas reais.
CENPEC Educação: Como a abordagem STEM foi incorporada ao processo?
Flávia Vasconcelos: Mesmo que os professores não tenham a formação ou a vivência da abordagem STEM, ela é perceptível em fases dos projetos, e, em alguns, em todo o seu desenvolvimento. Embora essa abordagem seja ainda uma novidade aqui no Brasil, entre os 10 projetos finalistas, os professores tiveram a preocupação em identificar em quais das diferentes fases do desenvolvimento ela é adotada. Em relação à sua área de conhecimento, de forma mais tradicional, eles procuram apontar em que momento do projeto estão envolvidos os conhecimentos mais detalhados da matemática, da física, da biologia, do desenvolvimento tecnológico etc.
CENPEC Educação: É importante que os professores ensinem metodologia científica em suas aulas?
Flávia Vasconcelos: Considero importante trabalhar princípios do pensamento científico na escola. No entanto, trata-se de um desafio para a formação de professores. É preciso prepará-los não só para ensinar metodologia científica, mas vivenciar isso nos cursos de formação docente. Hoje os novos cursos têm essa proposta, mas os professores formados há pelo menos cinco anos, de modo geral não têm essa vivência. E são esses professores que estão atuando nas redes hoje. Isso dificulta um pouco o desenvolvimento de trabalhos com rigor científico na escola. Mas há cursos, prêmios e outras iniciativas públicas ou privadas que disponibilizam materiais e ações, principalmente na internet, que promovem esse tipo de abordagem no ensino-aprendizagem. O objetivo é estimular os alunos a se interessarem e se desenvolverem no campo das ciências exatas e biológicas, que ainda têm uma procura relativamente baixa comparada a outras áreas no país.
Portal CENPEC Educação: Como ensinar os fundamentos da metodologia científica de forma articulada com os demais critérios indicados no RPA (colaboração e criatividade/inovação)?
Flávia Vasconcelos: Um ponto que identifico com grande potencial é o embasamento no entorno. Partir dos problemas do entorno é importante até para os estudantes perceberem que estão inseridos nesse meio e que podem buscar soluções a questões locais não apenas esperando a iniciativa governamental. Essa postura passiva é muito comum na sociedade em geral. Precisamos de políticas públicas, mas também é necessário buscar caminhos para responder a essas questões, de forma colaborativa, com o professor, a escola e a comunidade.
Por meio dessa sensibilização, é mais fácil estimular os estudantes a refletir sobre situações-problema reais e construir respostas baseadas na metodologia científica. Eles compreendem, dessa forma, que a ciência não está distante deles. Nesse aspecto, entra em jogo a criatividade em relação à realidade escolar: mesmo que a escola não tenha condições ideais, como espaço físico e materiais, é possível desenvolver projetos científicos. É possível também pensar em parcerias com outros colegas, professores e instituições além da escola. Assim, essas dificuldades iniciais podem levar a pesquisas na literatura científica, na internet, procurando materiais e procedimentos alternativos. Dessa forma, podem identificar, dentro de sua realidade, questões e caminhos com que a comunidade científica ainda não havia se deparado.
CENPEC Educação: Quais são os principais desafios para os professores da educação básica das redes públicas no ensino-aprendizagem de ciências, matemática e suas tecnologias?
Flávia Vasconcelos: Um grande desafio diz respeito à formação dos professores, como já abordei. Um segundo ponto é a resistência dos outros colegas e mesmo da gestão escolar. Um exemplo: eu sou professora da rede pública e, embora não tenha recebido formação inicial para isso, busquei materiais e estou desenvolvendo um projeto científico com meus alunos. No entanto, outros professores e gestores da escola dizem que estou trazendo muitas novidades e, além de não manifestar interesse em participar, oferecem resistência ao trabalho. Dessa forma, dificultam trabalhos nesse sentido. Um terceiro ponto é a infraestrutura, muitas vezes precária para o desenvolvimento de projetos científicos.
Apesar dessas dificuldades iniciais, há muita informação sobre metodologia de desenvolvimento de projetos científicos disponível gratuitamente na internet para a construção de caminhos alternativos. A questão é saber acessá-los e aplicá-los à realidade escolar e do entorno.
Entre os 10 finalistas, identificamos que, mesmo diante dessas precariedades, é possível fazer ciência nesses espaços. Não se trata de se conformar com a realidade problemática, mas iniciativas como essas estimulam que mais ações, públicas e privadas, sejam inseridas na escola, porque é a partir dela que teremos futuros cientistas, matemáticos, médicos. Penso que, quanto mais oportunidades oferecermos dentro da escola para que os estudantes comecem a pensar nessas e em outras áreas, é possível promover mudanças significativas em longo prazo. Se estimulamos o progresso científico, tecnológico e educacional, a tendência é o país se desenvolver.
Mais sobre os avaliadores:
Barbara Milan Martins: bióloga com mestrado pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP) e professora de didática das ciências no Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (Unesp).
Flávia Cristina Gomes Catunda de Vasconcelos: química com doutorado em ensino das ciências pela USP e professora do Centro Acadêmico do Agreste da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Lilian Bacich: bióloga e pedagoga com doutorado em psicologia escolar e do desenvolvimento humano da USP, coordenadora da pós-graduação em metodologias ativas do Instituto Singularidades.
Luís Augusto Alves: físico com doutorado em ensino de ciências pela Universidade de São Paulo (USP) e professor do Instituto Federal de São Paulo (IFSP).
Agora é a voz do público
A próxima etapa da premiação será a escolha dos três melhores projetos segundo o público. Para isso, as 10 equipes finalistas devem produzir um vídeo de até 3 minutos sobre o projeto e enviá-lo até 19 de setembro.
Os vencedores serão contemplados com troféus “Projeto vencedor pelo júri popular”, de valor simbólico, não comercial. O professor orientador e cinco estudantes representantes do projeto vencedor em primeiro lugar receberão uma viagem a São Paulo em novembro, para participação no Prêmio Respostas para o Amanhã América Latina.
Para orientações sobre produção e envio dos vídeos dos projetos finalistas, acesse o site do Prêmio Respostas para o Amanhã.
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