Em entrevista, a educadora Márcia Padilha Lotito fala sobre a metodologia e a concepção da Trilha Formativa, base do Desafio Inova Escola
Por Suzana Camargo
Adotar práticas que promovam inovação no cotidiano educativo não é tarefa simples para educadores das escolas brasileiras. Mas também não é impossível: muitas iniciativas têm demonstrado que a inovação nas escolas pode e deve acontecer. O Desafio Inova Escola, iniciativa promovida pelo Programa ProFuturo, por meio da Fundação Telefônica Vivo, com coordenação técnica do CENPEC Educação, é uma delas.
“Acreditamos que a construção colaborativa é a melhor forma de implantar novos conceitos na educação. O Desafio Inova Escola é resultado de uma construção coletiva na qual ouvimos especialistas, técnicos e escolas e cada um de nossos parceiros colocou sua experiência à disposição do projeto. Isso faz dele um prêmio ainda mais completo e especial”, explica Americo Mattar, diretor presidente da Fundação Telefônica Vivo.
Ana Cecília Chaves Arruda, coordenadora do Desafio Inova Escola no CENPEC Educação, destaca que o Desafio promove, por meio de uma Trilha Formativa, a reflexão para a comunidade escolar chegar a soluções educativas inovadoras. Segundo ela, o envolvimento de todos e o conhecimento da realidade local são importantes para vencer obstáculos e alcançar os objetivos. As inscrições estão abertas até 19 de agosto.
Trilha Formativa gratuita: um caminho para a inovação
A Trilha Formativa do Desafio Inova Escola é constituída, ao longo dos módulos que a compõem, por ações on-line e off-line, a serem realizadas nas escolas. As equipes inscritas são desafiadas a construir planos concretos de inovação. Espera-se que as ações propostas pelos planos sejam inspiração e desenvolvimento do aspecto inovador presente na escola, de tal forma que a inovação se torne parte da cultura daquela unidade escolar.
Os melhores planos serão reconhecidos por meio de premiações regionais e nacionais, entre eles, intercâmbio, encontros formativos, assessoria técnica e apoio financeiro de até R$10 mil, em 2020.
“A Trilha é o coração do Desafio Inova Escola”, explica José Alves, editor de comunicação da Diretoria de Difusão e Mídias do CENPEC Educação. “Ela permite que os educadores vivenciem o passo-a-passo da construção do plano de inovação”, conclui Alves.
Confira a entrevista a seguir:
CENPEC Educação – Você participou da elaboração da Trilha Formativa do Desafio Inova Escola. Conte como foi a criação.
Márcia Padilha – A Trilha Formativa do Desafio Inova Escola foi criada para ser uma mentoria on-line. É por ela que as escolas passam por um processo de inovação, sem queimar etapas. O objetivo é fazer com que a escola possa identificar os principais problemas existentes ou quais aspectos se deseja modificar, melhorar.
A Trilha ajuda os participantes a entenderem melhor em que contexto cada um dos aspectos estão inseridos, bem como as potencialidades dos profissionais de educação que atuam na unidade. Ela faz com que se atenham e se aprofundem ao conhecimento do problema que precisa ser superado. A Trilha norteia os educadores para a inovação, inclusive, por meio de práticas.
CENPEC Educação – Você poderia citar algumas práticas?
Márcia Padilha – A prototipagem, por exemplo. O protótipo é uma experiência que os realizadores de um processo de inovação realizam para aprender aspectos específicos e testar aquilo que desejam modificar, vivenciando, na prática, sua ideia. É um exercício muito importante para que não se vá direto para a inovação, sem a aprendizagem do que ela é e o que representa.
As etapas de criatividade são igualmente relevantes porque são momentos em que o coletivo vai exercitar o que chamamos de ‘pensamento divergente’ e ‘pensamento convergente’. Primeiro temos uma ‘chuva de ideias’ e depois vamos convergindo para uma escolha de inovação, que mais tarde será prototipada.
CENPEC Educação – Como, a partir da Trilha Formativa, os participantes constroem o plano de inovação?
Márcia Padilha – A Trilha é composta por cinco módulos e dá apoio à construção de um plano de inovação. Ela está estruturada por etapas de modo a oferecer conteúdos e ferramentas para que a equipe construa o seu próprio plano de inovação a partir da ação/reflexão e da construção de novos olhares sobre os impactos e as potencialidades do contexto escolar dos participantes.
As atividades foram planejadas para serem de simples execução. Após a realização de todas as atividades, é emitido um certificado de participação individual para cada integrante da equipe, com a carga horária de 32 horas.
CENPEC Educação- Quais são os desafios para a implementação de projetos inovadores nas escolas?
Márcia Padilha – Precisamos de uma gestão focada em desenvolver uma cultura de inovação na escola. Isso implica em criar tempos para estudos e para experimentações controladas, e, ainda, dentro de um clima institucional favorável à aprendizagem constante. Costumo tratar essa questão observando quatro vertentes: Gestão, Modelo Mental, Estudo e Avaliação.
CENPEC Educação – As experimentações podem trazer erros, não podem?
MárciaPadilha – Temos falado muito nesse universo escolar ser ‘favorável ao erro’. Na verdade, isso significa que não se pode aprender sem errar. Mas não é para ficar errando aleatoriamente. O ideal é que a escola tenha metodologia e clima favorável à inovação de forma a não culpabilizar as experiências, mas, sim, controlar as experimentações didáticas, pedagógicas e educacionais, aprendendo com elas e aperfeiçoando-as até que se chegue a um resultado mais maduro e robusto.
CENPEC Educação – É preciso uma gestão que contemple esse aspecto?
Márcia Padilha – Sim. Uma gestão focada em apoiar a cultura de inovação, tanto do ponto de vista da infraestrutura necessária, como no de ‘clima institucional’. Não se pode punir coordenadores pedagógicos ou professores que queiram fazer mudanças e para isso necessitam de mais apoio para colocá-las em prática.
CENPEC Educação – Quais seriam as mudanças nas metodologias de aprendizagem?
Márcia Padilha – Muitas vezes a escola desenvolve uma metodologia de aprendizagem focada essencialmente no professor. Na contramão disso, os movimentos de inovação estão relacionados aos métodos de ensino que colocam o aluno no centro do processo de aprendizado.
A mudança de uma visão para a outra parece fácil, mas é algo difícil de fazer do ponto de vista da didática, da gestão da sala de aula e de outros espaços. Implica na relação professor-aluno, alunos-conteúdos, professor-professor, aluno-aluno e professor-currículo. Enfim, o modelo mental pode ser uma barreira para a inovação se, para aplicá-la, é preciso desenvolver paradigmas adequados em processos de ensino centrados no aluno, e não apenas na metodologia de aprendizagem.
O professor precisa ter tempo para poder experimentar. Ele precisa ter práticas e estudo para que possa desenvolver suas hipóteses de inovação e de melhorias de processos de ensino. Quando ele não tem tempo para pensar, se organizar, planejar e avaliar sua proposta de inovação, fica difícil obter a aprendizagem e fazer as melhorias necessárias no processo.
CENPEC Educação – Apesar dos desafios que você citou, como é possível promover a inovação no ambiente escolar?
Márcia Padilha – Por meio desses mesmos elementos, pois quando bem trabalhados, se transformam em alavancas de sucesso, propulsoras da inovação. É preciso mudar os processos de uso do tempo e do trabalho colaborativo dentro das escolas.
Há vários recursos muito simples que podem tornar mais orgânicos os trabalhos coletivos e a avaliação de processos, que na verdade são pouco utilizados nas escolas e poderiam agregar muito. Estou falando de recursos e instrumentos do pensamento que emprestamos do design thinking, dos processos considerados ágeis, do pensamento visual e da co-criação.
CENPEC Educação – É um trabalho coletivo.
Márcia Padilha – Temos muito mais professores isolados tentando mudar seu modelo mental, estudando, observando, frequentando congressos, lendo livros até em outras áreas, do que gestores que organizam sua instituição de ensino para que ela seja um espaço voltado à cultura de inovação.
Não é uma crítica aos gestores. É que fazer isso é muito difícil, mesmo. E não só na escola. A sociedade em geral não é organizada para a inovação, experimentação e pesquisa. Por isso, uma iniciativa como o Desafio Inova Escola é tão importante. É uma oportunidade para que gestores e educadores descubram como trilhar o caminho para a inovação.
Sobre as inscrições no Desafio Inova Escola
A inscrição no Desafio Inova Escola acontece por equipes, que devem ser compostas por educadores de uma mesma instituição de ensino, com no mínimo dois e no máximo oito profissionais, e com ao menos um professor atuante em sala de aula. Os demais integrantes podem ser das variadas áreas e funções da escola. Cada escola pode participar com mais de uma equipe, desde que seus integrantes sejam diferentes, e a solução que buscam também.
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