Fórum Nacional de Educação: participar é preciso

-

Fórum Nacional de Educação: participar é preciso

Entenda como a sociedade civil se mobilizou nos últimos cinco anos desde que o FNE foi desmontado e saiba quais devem ser as prioridades dessa importante instância participativa

Por Stephanie Kim Abe

No dia 20 de março, o Ministério da Educação (MEC) anunciou a recomposição do Fórum Nacional de Educação (FNE). O órgão foi desmantelado em 2017, ainda no governo Temer, por meio da Portaria 577 do MEC, de 27 de abril, que trazia uma nova composição arbitrária, aparelhando o órgão. 

A recomposição é uma sinalização do governo à demanda de entidades que defendem a educação e da sociedade civil pela retomada desse importante espaço de controle social e gestão democrática. 

Na ocasião do anúncio da recomposicão, o ministro Camilo Santana afirmou que:

A reconstrução desse Fórum é um momento importante. O MEC está de portas abertas para ouvir, dialogar, aprender, construir conjuntamente. Só de mãos dadas, e por meio do fortalecimento da Educação, a gente vai conseguir construir um Brasil forte, soberano, fraterno e justo.”

Camilo Santana, Ministro da Educação

✏️

O papel dos fóruns de educação

Instituído em 2010 como uma conquista dos movimentos da sociedade civil que lutam pelo direito à educação, o Fórum Nacional de Educação (FNE) é um órgão de caráter permanente que oficializa o controle social pela sociedade civil dentro da perspectiva da gestão democrática. 

A lei 13.005 de 25 de junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE), estabelece o FNE como uma das cinco instâncias responsáveis pela avaliação e monitoramento do cumprimento do Plano.

Art. 5º A execução do PNE e o cumprimento de suas metas serão objeto de monitoramento contínuo e de avaliações periódicas, realizados pelas seguintes instâncias:

I – Ministério da Educação – MEC;
II – Comissão de Educação da Câmara dos Deputados e Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal;
III – Conselho Nacional de Educação – CNE;
IV – Fórum Nacional de Educação.

§ 1º Compete, ainda, às instâncias referidas no caput:
I – divulgar os resultados do monitoramento e das avaliações nos respectivos sítios institucionais da internet;
II – analisar e propor políticas públicas para assegurar a implementação das estratégias e o cumprimento das metas;
III – analisar e propor a revisão do percentual de investimento público em educação.

(Lei 13.005/2014

Claudia Bandeira, coordenadora da iniciativa De Olho nos Planos, explica que:

Foto: acervo pessoal

Dentro dessa composição, o Fórum é a instância mais plural, diversificada e democrática, porque ele envolve justamente a sociedade civil organizada que precisa estar à frente do controle social das políticas públicas educacionais.”

Claudia Bandeira

É papel do FNE organizar as conferências nacionais de educação, que devem acontecer a cada quatro anos, para avaliar a execução do PNE e trazer subsídios para a construção do plano de educação do próximo decênio.

A Conferência Nacional de Educação (Conae) é realizada em articulação com as conferências estaduais, municipais, distrital e regionais de educação, organizadas pelos respectivos fóruns.

Componentes da gestão democrática, de acordo com o guia da Iniciativa De Olho nos Planos (A participação na construção, revisão e monitoramento dos Planos de educação, p. 13)

✏️

Heleno Araújo, representante do FNE e presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), lembra as dimensões continentais do Brasil e da importância de um órgão que articula e dialoga com todos os 26 estados, Distrito Federal e 5.570 municípios:

Foto: acervo pessoal

Todos esses estados e municípios têm autonomia administrativa. Isso significa que, quando vamos atrás das metas e estratégias do PNE, na verdade, estamos olhando para o monitoramento e a execução de 5.570 planos municipais de educação, 26 planos estaduais de educação e 1 plano distrital de educação.

Daí a importância dos fóruns de educação, que acabam sendo essa instância que agrega tanto o setor público quanto o privado, mas principalmente a sociedade civil nesse processo de avaliação da aplicação das leis.” 

Heleno Araújo


A mobilização e o controle social não podem parar

Uma vez aprovado o PNE em 2014, foram construídos os planos municipais e estaduais de educação nos dois anos subsequentes, que se articulam ao PNE, mas olham, principalmente, para as demandas educacionais locais. 

Apesar de terem suas instâncias próprias de monitoramento e terem autonomia, municípios e estados também tiveram dificuldades nos últimos anos para implementar os seus planos de educação, muito por conta da falta de apoio do governo federal.

Claudia Bandeira lembra que a Emenda Constitucional 95/2016, que instituiu o Teto de Gastos, prejudicou muito as áreas sociais:

Congelar os recursos da educação por 20 anos inviabilizou o cumprimento das metas e estratégias do PNE. E, como temos um regime de colaboração entre municípios, estados e União, há um efeito cascata: quando se corta recursos em âmbito nacional, estados e municípios acabam ficando sem repasses. Apesar dessas dificuldades, reconhecemos que existiram esforços de iniciativas de localidades e fóruns de educação em manter os seus planos de educação vivos e o debate democrático junto à população”. 

Claudia Bandeira, coordenadora da iniciativa De Olho nos Planos

Em âmbito nacional, a descaracterização do FNE gerou uma mobilização paralela que congregou as entidades educacionais que foram excluídas do FNE, criando o Fórum Nacional Popular de Educação (FNPE). 

Nos últimos seis anos, o FNPE realizou a Conferência Nacional Popular de Educação (Conape), buscando manter o monitoramento participativo do PNE.

🗓️ O calendário da Conferência Nacional de Educação (Conae) costuma indicar as datas para as etapas estaduais, distrital e municipais de educação. Apesar dessa programação ainda não ter saído, dado que o FNE foi recomposto há menos de um mês, alguns fóruns municipais já estão se articulando para realizar as conferências municipais de educação. 

No município de São Paulo, por exemplo, as conferências regionais estão previstas para acontecer nos dias 14 e 15 de abril, e a conferência municipal nos dias 27 e 28 de maio.

Inscrições para as conferências regionais em São Paulo foram prorrogadas até dia 10/4. Acesse aqui o formulário de inscrição e participe!


Prioridades do FNE daqui em diante

De acordo com Heleno Araújo, a primeira reunião do FNE recomposto deve acontecer ainda este mês. “A expectativa é que ainda esta semana seja divulgada a Portaria com os nomes das pessoas que vão representar as entidades do FNE”, diz.

Será preciso discutir e definir quais serão os próximos passos do FNE. De acordo com o art. 12 da Lei do PNE, o governo deve encaminhar até junho de 2024 um projeto de lei sobre o PNE 2025 – 2035 ao Congresso Nacional. 

Este projeto deveria ter como base o documento final da Conae 2022, mas como a Conferência ocorreu ainda sob o âmbito da Portaria 577, ele não ajuda muito na formulação do novo PNE. Precisamos também debater com o governo federal quais as ações que serão possíveis de serem feitas: chamar outra conferência? Há estrutura organizacional para isso? Há financiamento?

Heleno Araújo, representante do FNE e presidente da CNTE

Ele também relembra que há muitas urgências: “Temos que conversar sobre a situação do Novo Ensino Médio, do projeto de lei de homeschooling, do programa das escolas cívico-militares, além, claro, das metas que não foram encaminhadas no atual PNE.”

✏️

De acordo com o 8º Balanço anual do Plano Nacional de Educação (PNE – Lei 13.005/2014), realizado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, 86% do PNE não foi cumprido

Claudia alerta que, além do descumprimento, algumas metas retrocederam – tais como os indicadores de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Para ela, uma prioridade do FNE deve ser discutir como fazer para garantir recursos financeiros para a execução do Plano.

Sabemos que, historicamente, os planos de estado na educação – como o PNE – não foram implementados justamente por corte de recursos. Então um grande desafio é discutir como articular o planejamento público (no caso, os planos de educação) com o financiamento adequado. Se não, não será possível avançar na garantia do direito à educação”.

Claudia Bandeira, coordenadora da iniciativa De Olho nos Planos

Já Heleno acredita que é preciso ter uma lei que responsabilize as(os) governantes pelo não cumprimento das leis educacionais. “Um desafio forte que está colocado para nós é como ter um instrumento legal que obrigue o poder público a cumprir a lei, como a Lei de Responsabilidade Educacional. Caso ele não cumpra, que haja uma punição dura”, diz.

✏️

Materiais para subsidiar a participação na construção e monitoramento dos planos de educação

Como organizar uma conferência de educação? Quem pode participar? Qual o papel do Conselho Municipal de Educação? E do Fórum? Onde encontrar dados para saber se as metas do plano estão caminhando? 

Essas são algumas das muitas dúvidas que muitas pessoas têm ao pensar na construção de processos participativos e no monitoramento dos planos de educação – e que demonstram que o controle social ainda não está bem estabelecido nas políticas públicas de educação como deveria.

Para ajudar nessa jornada, a iniciativa De Olho nos Planos disponibiliza diversos materiais que respondem a essas e outras questões sobre gestão democrática, participação efetiva, construção, revisão e monitoramento de planos de educação e muito mais. 

O guia A participação na construção, revisão e monitoramento dos Planos de educação é o mais completo, mas há outros guias da Coleção focados em diferentes temas, como na participação de crianças e adolescentes. Há, inclusive, um jogo de cartas que estimula o debate com crianças e adolescentes sobre a escola que possuem e que querem para o futuro, e que pode servir para subsidiar o debate das metas do Plano de Educação com as(os) estudantes. 

🔎 Clique aqui para acessar o portal De Olho nos Planos

Vídeo produzido pela iniciativa De Olho nos Planos sobre monitoramento participativo dos Planos de Educação 


Veja também