Mulheres negras no cenário nacional

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Mulheres negras no cenário nacional

Autoria: Educação&Participação
O que é?

Pesquisa sobre mulheres negras de destaque na vida do país.

Material
  • Computador com acesso à internet, data show.
  • Folhas de papel pardo.
  • Filipetas de cartolina.
  • Pincéis atômicos de diferentes cores.
  • Revistas e jornais.
  • Tesouras.
  • Cola.
  • Baú com adereços para teatro.
Finalidade

Compreender que a situação profissional das mulheres negras decorre de diferenças de oportunidades que a sociedade oferece à população negra, consequência de uma construção histórica.

Expectativa

Valorizar a vida de todos os seres humanos e a igualdade de oportunidades, de tratamento e de justiça para todos os cidadãos, sem exceção.

Público-alvo

Adolescentes e jovens

Espaço

Sala de atividades

Duração

2  encontros de 1h30

Início de conversa

A situação da mulher negra no Brasil é herança da escravidão de 400 anos. A marginalização dos afro-descendentes não se resolvem com a abolição da escravatura. Expulsa das fazendas, sem condições de trabalho e moradia, a população negra passou a viver na miséria, sem possibilidade de sobrevivência digna.

Alberto Henschel. Escravizada ama de leite com criança em Pernambuco, 1874. Fonte: Wikipédia

A sociedade brasileira deixou os negros à margem de sua dinâmica social, econômica e cultural. Nada fez para sua inserção. Ao contrário, desenvolveu uma política de embranquecimento da população, estimulando a imigração estrangeira. Sem acesso à educação, à saúde, ao trabalho, a grande massa dos negros permaneceu muito pobre.

A mulher negra continua em último lugar na escala social e é aquela que mais sofre as injustiças do racismo. A maioria das pesquisas realizadas nos últimos anos mostra que os negros, particularmente as mulheres, apresentam menor nível de escolaridade, trabalham mais, com rendimento menor, o que reforça o preconceito e a interiorização da condição de inferioridade e, em muitos casos, inibe a reação e luta contra a discriminação sofrida.

Não é à toa que é maior a presença de mulheres negras no trabalho doméstico. Esse fato está relacionado à questão de gênero, mas também ao cenário de desigualdade racial: as mulheres negras têm menor escolaridade e maior nível de pobreza. E o trabalho doméstico, por ser desqualificado, desregulado e de baixos salários, acaba por constituir para elas uma das poucas opções de emprego.

Como nas últimas décadas as mulheres estão entrando cada vez mais no mundo do trabalho, têm delegado as funções domésticas a outras mulheres, cuja maioria é negra. Desse modo, a entrada de mulheres no mundo do trabalho não só não altera a divisão sexual do trabalho, como também reforça uma divisão racial do trabalho doméstico. Mas, apesar disso, houve, concomitantemente, nas últimas décadas, muitos avanços decorrentes das lutas do movimento negro. Assim, embora o contexto seja adverso e a maior parte das mulheres negras trabalhe como empregada doméstica, muitas conseguiram viver a experiência da mobilidade social.

Durante um bom tempo, a forma de ascensão social dos negros se deu apenas pelo esporte e pela arte, particularmente com a música. No teatro e na TV, no entanto, artistas negros/as assumiam apenas papéis subalternos.
Felizmente, essa realidade vem mudando. Há algum tempo atrizes negras deixaram de interpretar apenas papéis de empregadas ou escravas e passaram a ocupar os núcleos mais importantes das novelas brasileiras. Uma parcela de mulheres negras conseguiu vencer as adversidades e chegar à universidade, utilizando-a como ponte para o sucesso profissional nas ciências, na literatura, na magistratura, na tecnologia e em outras áreas.

No entanto, essas mulheres que conquistaram melhores cargos no mercado de trabalho tiveram que fazer esforço redobrado, em comparação com mulheres de outros setores da sociedade, para chegar nesse lugar. Pois, além da necessidade de comprovar a competência profissional, tiveram de lidar com o preconceito e a discriminação racial. A questão de gênero é, em si, um complicador, mas, quando somada à da raça, dobra as dificuldades.

Na prática

Sugestão de encaminhamento

1º encontro: Quem são elas? Onde estão?

Comunique que a oficina do dia tratará das mulheres negras na sociedade brasileira de hoje. Para começar, peça que se organizem em grupos e distribua várias filipetas de cartolina para cada um dos grupos.

Os participantes escreverão, nas filipetas, os nomes de personalidades femininas negras famosas de que se lembram (uma em cada filipeta) e, em filipetas correspondentes, o que cada uma faz profissionalmente: cantora, rapper, atleta, etc.

Essas filipetas serão afixadas com fita crepe num painel pendurado na parede, constituído de folhas de papel pardo coladas, formando duas colunas correspondentes: uma com os nomes das mulheres e a outra com as respectivas profissões.

Marcha das Mulheres Negras
Marcha das Mulheres Negras em Brasília, 2015. Foto: Marcello Casal/Agência Brasil

Leia com eles a relação dos nomes e respectivas profissões. A seguir, proponha que agrupem as filipetas com os nomes das mulheres negras com as mesmas profissões, formando conjuntos; por exemplo, com nomes de atrizes, de cantoras, de atletas, etc. Contorne cada conjunto com pincel atômico de cor diferente e cole uma filipeta com o nome da profissão das pessoas do conjunto, para identificá-lo.

Peça que observem a quantidade de áreas profissionais citadas. Quantas foram organizadas? Existiriam outras?

Pergunte se sabem da presença de mulheres negras em outras áreas de destaque que não apareceram nessa relação. Levante outras áreas de atuação não citadas, como, por exemplo, as de jornalismo / política / medicina / pesquisa científica/ literatura / magistratura / poesia/ outras, para que escolham pelo menos quatro, com as quais ampliarão a relação original.

Escolhidas as áreas, forme quatro outros conjuntos vazios no painel da parede, contornados por outras cores, com os nomes das áreas que escolheram. Pergunte se lembram de ter visto, lido ou ouvido sobre mulheres negras nessas áreas.

E se?
Se não citarem mulheres negras de destaque nessas outras áreas, questione por que acham que isso acontece: não há mulheres negras nessas áreas?

A única forma de saber é investigar. Por isso, proponha que, em duplas, pesquisem na internet, em sites oficiais ou do movimento negro sobre “mulheres negras de destaque no jornalismo brasileiro”, por exemplo, ou “mulheres negras de destaque na política brasileira”. Metade das duplas pesquisarão duas das quatro áreas escolhidas e a outra metade, as outras duas. As duplas preencherão novas filipetas com os nomes das profissionais que encontrarem.

Dê cerca de 30 minutos para a pesquisa e abra para socializarem as informações que encontraram. Peça que incluam os nomes encontrados na pesquisa, nas áreas que estão vazias, dentro dos conjuntos expostos no painel.

Quando terminarem, proponha que observem a quantidade de profissionais relacionada nas diferentes áreas profissionais e que pensem sobre a seguinte questão: por que algumas áreas concentram um número maior de mulheres negras do que outras? Anote as hipóteses que levantarem sobre tais questões, sem problematizá-las, nesse momento. Apenas anote.

Convide-os, então, a assistirem a dois pequenos vídeos. No primeiro, uma criança negra não reconhece a médica de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) como médica por que não está acostumada a ver homens e mulheres negros nessa profissão.

No outro, uma estudante de medicina do Prouni (Programa Universidade para Todos, adotado no país a partir de 2004), fala sobre o preconceito de brancos em relação à presença de negros na universidade, especialmente na de Medicina, tão concorrida e tradicionalmente frequentada por estudantes da elite.

1º vídeo: Negra, médica, doutora?

2º vídeo: Entrevista com a estudante de medicina pelo Prouni Suzane da Silva

Terminada a projeção, abra para comentários da turma: o que diz cada vídeo? O que eles têm em comum? Que ideias são veiculadas neles? Que conclusões podemos tirar deles? Como essas conclusões ajudam-nos a entender a ausência ou a presença mínima de mulheres negras em determinadas profissões?

Peça que retomem as hipóteses levantadas anteriormente por eles para explicar a ausência de mulheres negras em algumas áreas de atuação e que escolham as que mais se aproximam das respostas possíveis a essas questões, como: poucas são as mulheres negras que ocupam posições de destaque no país porque não têm oportunidades e condições de acesso aos estudos superiores.

Isso é particularmente verdadeiro em relação às profissões que exigem mais tempo de formação e maior intensidade de estudo para ocupá-las. Abraçar essas áreas profissionais implica dispor de tempo, não precisar trabalhar para se dedicar ao estudo, possuir recursos para sustentar compra de livros e mesmo moradia e alimentação, quando a universidade está localizada distante da residência ou em outra cidade.

Para fixar essas ideias a fim de encerrar este primeiro encontro da oficina, proponha que elaborem uma frase coletiva que resuma o assunto tratado nesse dia, registrando-a em um cartaz que ficará afixado na parede da sala e servirá como memória do que o grupo já produziu, para a realização do segundo encontro.


2º encontro: O que dizem as pesquisas?

Para o segundo encontro, antes que os estudantes cheguem, exponha nas paredes da sala algumas das filipetas que se encontram logo abaixo, com alguns dados de pesquisas que se referem à situação social do negro no Brasil e à participação de mulheres negras em algumas áreas de atuação, na sociedade brasileira.

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pixta.jp

>> Os negros (pretos e pardos, conforme classificação do IBGE) constituem 53,6% da população brasileira. Estão entre os 10% mais pobres, com renda média de R$ 130 por pessoa na família (IBGE, censo 2014).

>>  14% da população feminina trabalha em serviços domésticos (5,9 milhões). Entre as mulheres brancas, 10 % são domésticas enquanto entre as negras são 17,7% (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD 2014, IBGE).

>> Segundo um levantamento do Grupo de Gênero da Escola Politécnica da USP (Poligen), em 120 anos, nem dez mulheres negras se formaram engenheiras. (A Politécnica foi criada em 1893.)

>> Na lista das pioneiras das ciências no Brasil, criada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), nenhuma das mulheres citadas é negra.

>> O Censo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aponta, no perfil dos magistrados brasileiros, que os negros somam 15,4% (CNJ, 16/6/2014).

>> Dados da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) apontam que negros e negras jornalistas, juntos, somam somente 23% desses profissionais (documento do 36º Congresso, 2014).

>> Nas eleições de 2010, aproximadamente 4% apenas, do total de candidaturas a todos os cargos (Presidência, Câmara Federal e Senado), eram de mulheres negras.

>> Dos 513 deputados federais eleitos em 2014, 22 se declararam negros ao TSE. Desses, apenas quatro eram mulheres.

>> Nas eleições municipais de 2016, das vereadoras eleitas, 3,9% eram negras. Somando mulheres brancas e negras, eram 9,2% (Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

>> Na carreira de medicina, apenas 2,66% dos concluintes em 2010 eram pardos ou pretos (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – Inep).

>> Em seis das dez carreiras mais concorridas da Fuvest em 2015, nenhum candidato negro foi aprovado no vestibular e se tornou calouro da Universidade de São Paulo (USP).

>> Em 2016, dos 298 ingressantes na Medicina USP, 238 eram brancos (79,9%); 2 eram pretos (0,7%); 22 eram pardos (7,4%); 36 amarelos (12,1%) e  nenhum indígena.

Conforme forem entrando, oriente que circulem pelas filipetas e leiam as informações que elas trazem, anotando uma ou duas que mais chamam a atenção deles.

Dê um tempo para lerem com calma e absorverem as informações. Forme uma roda, a seguir, para que comentem os dados que mais chamaram a atenção e por quê.

Pergunte ainda o que, no conjunto, as informações revelam e estimule que façam relações com os depoimentos veiculados nos vídeos do encontro anterior e na síntese que fizeram como memória: os dados confirmam ou contradizem o que foi visto?

Conforme forem falando, registre as ideias principais em um cartaz. Estimule que todos se expressem, pois é importante que construam sua visão sobre o assunto e aprendam a justificar suas posições.

Esgotados os comentários, faça uma síntese oral, a partir do que falaram. Ressalte que fica claro, com os dados das pesquisas, que o acesso da população negra e particularmente das mulheres negras pobres a determinadas posições de prestígio da sociedade é bem pequeno ainda, apesar de todos os esforços feitos pelos movimentos sociais negros ou não negros, defensores da causa.

Essa situação traz como consequência a construção de uma autoimagem negativa, pois a falta de participação do negro em posições de destaque influencia em como ele se vê na sociedade, ou seja, na constituição de sua identidade. Se ele só vê brancos bem-sucedidos na vida social, econômica, política e cultural do país, como se sente?

Por que isso acontece?

Akshayapatra/Pixabay

Explique que a população negra, escravizada por 400 anos no Brasil, foi marginalizada pela sociedade brasileira depois da abolição, pois não se criaram mecanismos para a inserção dela na vida social, econômica e cultural do país, impedindo sua mobilidade social. Assim, sem terem acesso à educação, à saúde, à moradia, a ela têm sido historicamente reservados, em sua maioria, os trabalhos mais simples, subalternos e mal-remunerados, até os dias atuais.

Os movimentos de luta e resistência dos negros sempre existiram, desde a escravidão, com os quilombos e foram se fortalecendo através dos tempos. Houve, sem dúvida, muitos avanços, mas estamos ainda bem longe da igualdade de tratamento em relação aos brancos.

Daí a importância das cotas raciais que vêm sendo adotadas no país, desde 2004, e que junto com as cotas sociais têm aberto oportunidades para a população negra e indígena (cotas raciais) e para a população pobre (cotas sociais), sem as quais elas não teriam acesso aos estudos superiores e, consequentemente, aos trabalhos mais bem remunerados e prestigiados.

Na sequência, oriente que formem grupos e discutam como expressar essa situação de opressão, que a maior parte da população negra ainda vive no Brasil, escolhendo uma linguagem que consideram mais adequada ao que desejam expressar. Pode ser composição de gravuras, produção de vídeo no celular, desenho, frase, poema, grito de guerra, rap, música, paródia, cordel, quadrinhos, cena teatral, etc.

Disponha o baú com revistas, cola, tesouras, pincéis. Após aproximadamente 30 minutos, cada grupo apresentará sua produção para o coletivo. Peça para alguns gravarem as apresentações em vídeo, no celular, para eventuais usos futuros.

Hora de avaliar

Em roda, peça a cada grupo que escolha uma palavra para representar a sua avaliação da oficina e revele-a ao coletivo, justificando a escolha.

Avalie com eles também a participação nos grupos (se houve tranquilidade para o desenvolvimento das tarefas ou se houve algum conflito e, nesse caso, como resolveram), e também peça que explicitem as aprendizagens que consideram terem realizado.

Para ampliar

O que mais pode ser feito?

Você pode indicar sites do movimento negro para os estudantes acessarem, manterem-se informados e entrarem em contato com os organizadores.

Também pode aprofundar o tema com a realização de uma mesa-redonda, organizada pelos próprios estudantes, convidando pessoas engajadas no movimento, militantes da causa e professores de história, sociologia e filosofia. O evento pode começar com a projeção do vídeo realizado com as produções que fizeram na oficina.

Para saber mais

A situação social da população negra não é apenas uma questão social. O racismo representa a não aceitação da condição de cidadania dessa população. Não basta lutar para melhorar as suas condições de acesso aos bens de consumo. É preciso lutar contra a discriminação, que gera desigualdade de oportunidades entre pessoas de diferentes etnias. Uma das principais lutas do movimento negro e de estudiosos comprometidos com a defesa da dignidade humana é contribuir para o resgate da cidadania dos afro-descendentes.

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Conceição Evaristo. Foto: Richner Allan/Enciclopédia Itaú Cultural

A escritora Conceição Evaristo ressalta que apesar dos índices desanimadores, as mulheres negras não podem deixar de lutar e sonhar com um futuro próspero.

Teoricamente já vivemos em um futuro melhor e podemos continuar almejando melhorias. Já colocamos o dedo na ferida. Do discurso da denúncia, passamos para a cobrança dos nossos direitos.”

Conceição Evaristo

Em relação às condições de trabalho, educação e saúde da mulher negra, a escritora acredita que só serão revertidas com programas sociais, como as cotas nas universidades federais, nas empresas privadas e com o atendimento específico para a saúde da população negra.

Só as políticas afirmativas podem enfrentar as grandes desigualdades sociais brasileiras, como o aumento do salário mínimo, o Bolsa Família, as cotas no trabalho, promovendo avanços nessa direção, como comprovam os dados das pesquisas. Mas, apesar de várias conquistas, ainda há muito pelo que lutar.

Referências

Enciclopédia Itaú Cultural: Conceição Evaristo

EBC: Mulheres negras se mobilizam no Rio contra o racismo e pela inclusão

Panorama Ipea – Retrato das mulheres negras no Brasil

IPEA, 2014 – Estudo detalha avanços femininos no mercado de trabalho

A mulher negra. Revista Espaço Acadêmico – Ano II, nº 22, março de 2013

Eleições 2016: No Brasil, mulheres negras não têm vez na política – Instituto de Estudos Socioeconômicos – Inesc

O feminismo negro no Brasil: um papo com Djamila Ribeiro – Afreaka

Agência Patrícia Galvão: Quantas mulheres negras você conhece trabalhando com tecnologia e inovação?: #PretaLab!

Não há calouros pretos em seis dos 10 cursos mais concorridos da Fuvest

IBGE: Acesso de negros à universidade cresce; maioria ainda é branca

Geledés – Instituto da Mulher Negra

 Criola – ONG – Organização de Mulheres Negras

UNFPA – (Fundo de População das Nações Unidas)


Veja também:

Artigo: Educação integral e equidade racial (Paola Prandini)

Ações afirmativas para quê?