Conheça a história em quadrinhos sinalizada em Libras que conta a história do povo indígena terena e sua língua de sinais
Por Stephanie Kim Abe
A pajé surda Kaxé é chamada para auxiliar um parto, ritual típico da sua comunidade indígena. No momento em que pede a benção aos ancestrais, a pajé recebe também a visão do futuro do seu povo terena por meio de imagens. Esse episódio, que acontece em algum momento antes do século XV, é pontapé para a história que se desenvolve na história em quadrinho (HQ) Sol, a pajé surda.
A partir daí, o enredo se desenvolve contando os principais momentos históricos do povo terena, como o início com o tronco linguístico Aruak, os caminhos percorridos, em torno do rio Paraguai, e a sua fixação na região de Mato Grosso do Sul – onde se encontra a maioria do povo terena atualmente.
Ao longo da narrativa, descobrimos também a históra da língua terena de sinais – uma das 14 línguas de sinais documentada no Brasil hoje. Se por si só esse enredo já seria super interessante, ele se torna mais inédito pelo fato de o autor Ivan de Souza utilizar a língua de sinais mais conhecida no país para contar essa história: a Libras. A professora Kelly Cezar, autora-orientadora da obra, explica:
Utilizamos uma história em quadrinhos sinalizada em Libras para contar a história do povo terena e mostrar que a língua terena de sinais sempre existiu nessa comunidade. A ideia é trazer à tona que o Brasil é plurilíngue, ou seja, além do português, nós temos outras línguas concomitantes e minoritárias, que correm risco de extinção.”
A obra é fruto do trabalho de conclusão do curso de licenciatura Letras-libras na Universidade Federal do Paraná (UFPR) de Ivan de Souza, que também é tradutor e intérprete de Libras. Ela faz parte do projeto de pesquisa institucional HQ’s sinalizadas, idealizado pela professora Kelly. O objetivo do projeto é criar histórias em quadrinhos bilíngues.
As línguas de sinais são tridimensionais, não são escritas. Elas acontecem no espaço, visualmente. Por isso que a nossa HQ é uma metodologia inédita, porque ela se baseia no uso da imagem principalmente, e conta com os recursos visuais, por meio de QR codes nas obras. Eles levam para vídeos no YouTube que você tem a Libras, ou a língua de sinais, como primeira língua sendo passada. O que para os ouvintes pode parecer como dois momentos, para os surdos, que funcionam de forma bilíngue, esse processo do vídeo, imagens e escrita ocorre concomitantemente.”
Kelly Cezar
No caso da obra Sol: a pajé surda, que é principalmente sinalizada em Libras, também, em segundo plano, a língua portuguesa e a língua terena escrita. Na capa da HQ, por exemplo, vemos o nome da obra escrito em destaque em língua terena: “Séno Mókere Káxe Koixómuneti”, com o equivalente mais próximo da tradução para o português embaixo.
A língua terena de sinais foi primeiro comprovada pela pesquisadora e linguista Priscilla Alyne Sumaio Soares, que frequenta a Terra Indígena Cachoeirinha, na cidade de Miranda (MS). Ela fez parte do projeto, assim como a pesquisadora Denise Silva, presidente do Instituto de Pesquisa da Diversidade Intercultural (Ipedi), e alguns indígenas terenas que se interessaram pelo projeto uma vez contatados por Ivan pelas redes sociais.
Essa colaboração foi essencial para garantir um trabalho minuncioso e fiel às tradições da cultura terena. O cuidado com a representação está tanto nas ilustrações de Julia Ponnick (por meio das pinturas corporais, danças, artesanato, cenários de plantações), como na própria narrativa, que é um misto de ficção e fatos históricos de registros escritos e orais, transmitidos ao longo das gerações na comunidade terena.
Em trecho do seu depoimento sobre a sua participação, a terena Kaliny Pontes Memede, da aldeia Jaguapiru, em Dourados (MS), conta como contribuiu para o enredo da obra:
Cada família tem uma forma que a história é contada. Então essa história foi contada pelo meu avô, pro meu pai, e assim foi passando. Assim como a língua, a forma que se pronuncia, conforme o tempo, ela vai tendo mudanças. Vivemos um mundo de mudanças, que vai se adaptando ao momento. E assim foi passado pra mim. É gratificante mesmo participar do projeto.”
Kaliny Pontes Memede
A tradução em terena escrito e a revisão da história terena foi feita por Maiza Antonio, Terra Indígena Cachoeirinha (MS), que é professora das escolas indígenas e pesquisadora do Ipedi. Ela explica, em depoimento disponível em língua terena escrita/oral, língua portuguesa escrita/oral, libras e língua inglesa escrita/oral, a importância da HQ para o seu trabalho na comunidade:
A HQ é de suma importância, pois, por desconhecimento, por falta de incentivos, por falta de materiais específicos e por falta de profissionais, não conseguimos transmitir os saberes escolares nem em Libras e nem em língua terena de sinais aos nossos estudantes surdos. Infelizmente, ainda recorremos à leitura labial, o que não fortalece e nem garante um aprendizado efetivo. Que mais materiais como esse venham a ser produzidos, que respeitam e trabalham em conjunto com a comunidade, a fim de estimular novas pesquisas e o protagonismo dos indígenas surdos.”
Em entrevista à rádio Light FM Curitiba este mês, o autor Ivan de Souza explicou a importância da obra para além da comunidade terena:
Para as demais etnias [essa HQ é a possibilidade de] uma nova forma de registrarem sua história e de forma acessível não só a ouvintes mas também a surdos. Para a sociedade em geral a HQ é importante pois leva a informação de que vivemos em um país com vários povos, culturas, identidades e línguas diferentes. E que essa diversidade precisa ser respeitada, preservada e valorizada minimizando a crença de que vivemos em um país com apenas uma língua, o português considerado padrão.”
O pré-lançamento da HQ acontece este sábado (dia 27/03), durante a banca de defesa do TCC de Ivan de Souza. Foram impressos apenas 200 exemplares, e a pré-venda ocorre pelo site da editora Letraria a partir de amanhã (dia 27). Todo o valor arrecadado será repassado ao Ipedi para financiar a criação e o desenvolvimento de um curso de formação de professores(as) para as aldeias indígenas.
A gestão do curso ainda está em fase embrionária e deve ser realizada de forma interinstitucional, por meio de uma parceria do grupo de pesquisa Formação de professor em Línguas da UFPR, o Ipedi, a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Além de ser uma devolutiva da pesquisa para a comunidade pesquisada, a criação da formação pode atingir outras aldeias, como explica a professora Kelly:
Muitos professores e intérpretes que adentram as comunidades indígenas não sabem lidar com as diferentes línguas, em específico as de sinais. A nossa ideia é criar um modelo de formação, que sirva para diferentes etnias, que possa ajudar esses profissionais a valorizar essas líguas de minorias e empoderar os seus registros, para que elas não sejam extintas. Estamos ponderando todas as variáveis, porque apesar de parecer claro para nós que vivemos na cidade que o curso seja gratuito e on-line, sabemos que a realidade das escolas indígenas é outra, que não tem acesso à internet. Então gostaríamos de organizá-lo também na modalidade offline.”
Kelly Cezar
No futuro, os autores pretendem também lançar a versão digital da obra, para ser disponibilizada gratuitamente na rede, e distribuí-la em escolas indígenas, bilíngues para surdos e inclusivas.
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