Publicação traz artigos sobre a importância do SNE em diferentes frentes, como educação infantil, avaliação, educação escolar indígena e valorização docente; saiba mais
Por Stephanie Kim Abe
Aprovado no Senado por unanimidade em março de 2022, o PLP 235/2019, que institui o Sistema Nacional de Educação (SNE), agora está à espera de uma relatoria na Câmara dos Deputados.
Ainda que ele tenha sido muito discutido nos últimos anos, há muitas pessoas que ainda não sabem qual a sua importância e como ele afeta diretamente a vida de estudantes, educadoras(es) e comunidade escolar como um todo.
Foi pensando nessa questão que o Movimento Colabora e a Frente Parlamentar Mista da Educação lançaram, neste mês, o livro Sistema Nacional de Educação na Prática.
A publicação é fruto de uma série de debates que as duas organizações realizaram em conjunto, discutindo diferentes temáticas e perspectivas. Assim, os artigos que compõem essa publicação e que foram escritos por parlamentares versam sobre Base Nacional Comum Curricular (BNCC), educação infantil, alfabetização, avaliação educacional, Enem, profissão docente e educação escolar indígena.
Conforme a mensagem dos organizadores Fabiano Jorge Soares, Igor Magalhães Queiroz e Fernanda Castro Marques, todos do Movimento Colabora, no começo do livro:
Com o SNE, será instituído um espaço amplo de pactuação entre os entes federados, o que proporcionará uma gestão integrada, trazendo a corresponsabilidade na condução das políticas educacionais para o núcleo do debate. O deslocamento no foco da atenção por parte dos entes federados — da rede de ensino para a trajetória estudantil — garante que a atuação do poder público esteja diretamente voltada à resolução dos problemas comuns, trazendo uma série de efeitos positivos: otimização no emprego dos recursos, redução das desigualdades e aumento na qualidade da educação”.
Para dar mais detalhes sobre a publicação e contar quais as perspectivas de aprovação da matéria na Câmara dos Deputados, conversamos com o Professor Israel Batista, deputado federal pelo Distrito Federal e presidente da Frente Parlamentar Mista da Educação.
Confira abaixo:
Portal Cenpec: Por que a Frente Parlamentar Mista da Educação escolheu o SNE como uma de suas pautas prioritárias?
Deputado Professor Israel Batista: Primeiro, já havia uma determinação do Plano Nacional de Educação (PNE – Lei 13.005/2014) para que se instituísse um Sistema Nacional de Educação até 2016. Ele seria uma espécie de equivalente do SUS da Educação, digamos assim. Infelizmente, esse assunto vem sendo negligenciado há um tempo, e essa meta do PNE de criar o SNE não foi cumprida.
A pandemia mostrou a debilidade de um regime de colaboração entre municípios, estados, Distrito Federal e União que ocorre sem regras de coordenação nacional e com falta de uma especificação. Tanto que hoje, apesar dessa colaboração, nós temos redes disfuncionais e gastos irracionais.
Nós não conseguimos efetivar o regime de colaboração preconizado na Constituição, porque não existe colaboração se você não tem canais de diálogo entre as redes e se você não tem um sistema que coordene tudo isso nacionalmente, levando em consideração principalmente a heterogeneidade do país.
Com a pandemia, toda essa situação que vinha sendo negligenciada tornou-se insuportável – a ponto de o governo federal marcar a prova do Enem sem consultar os municípios que iam ceder as salas para os alunos que iam fazer a prova, em plena pandemia. Por isso, a Frente teve que entrar judicialmente e, inclusive, lançar a hashtag #AdiaEnem, porque começamos a receber reclamações de representantes dos secretários estaduais (Consed) e municipais (Undime). Veja como a pandemia demonstrou a debilidade do Brasil pela falta de um sistema Nacional de Educação!
Assim, nós, da Frente de Educação, percebemos a absoluta necessidade de se criar um SNE, para que os entes federativos não jogassem a responsabilidade uns para os outros.
Portal Cenpec: Como foi feita a escolha dos temas abordados no livro?
Deputado Professor Israel Batista: O critério de escolha foi relacionado a área que cada parlamentar que compõem a Frente de Educação tem mais afinidade. Alguns se sentiram mais à vontade com temas diferentes dos quais estavam acostumados, mas tudo bem. Não foi mandatório.
O meu artigo, escrito junto com o deputado Pedro Cunha Lima, tem como tema a valorização docente, já que eu me debruço há muito tempo sobre esse assunto e o deputado Pedro Cunha Lima era, até então, o nosso Coordenador de Valorização Docente.
Durante a pandemia, nós vimos que muitas redes não conseguiram dar apoio às(aos) professoras(es), que tiveram que inventar práticas. Nós vimos de tudo! Visitamos, por exemplo, um professor que colocava os exercícios com o nome de cada aluno no varal do quintal de sua casa para que eles passassem lá e pegassem, com medo de contágio.
Percebemos que, se houvesse uma coordenação entre os entes federativos, talvez nós pudéssemos municiar esse exército silencioso de professoras(es) – que manteve o mínimo de funcionamento das atividades escolares às custas da sua própria criatividade – com ferramentas adequadas e apoio para que pudessem realizar um trabalho melhor do que o que foi feito.
Pensar o SNE na prática relacionado à questão docente é entender que ele poderia melhorar o tratamento de alguns problemas históricos da carreira docente – como a formação, a qualificação, o desenvolvimento continuado, a precariedade das condições de trabalho, a defasagem salarial. Todas essas questões poderiam ser tratadas mais facilmente em uma instância de diálogo entre os entes federados.
Com o SNE, nós podemos induzir melhorias nessas frentes e ainda criar uma campanha pública de valorização docente, tornando a profissão mais atrativa. Ao melhorar a formação, a qualificação, a qualidade das condições de trabalho e resolver a defasagem salarial exacerbada, nós impactamos a garantia de aprendizagem – principalmente quando o ente mais rico condiciona o financiamento da política pública.
Por isso, eu estou muito convicto e baseado em evidências ao dizer que o SNE é essencial para melhorar a profissão docente em um país heterogêneo, continental e muito regionalmente desigual como o nosso.
Portal Cenpec: Qual o público alvo deste livro?
Deputado Professor Israel Batista: Primeiro, os formadores de opinião. Precisamos colocar o SNE na agenda do dia – e, para isso, precisamos atingir a imprensa, os jornalistas especializados em Educação, as comunidades de advocacy no Congresso e os tomadores de decisão.
Precisamos mostrar para prefeitos, governadores, secretários de Educação que esse assunto interessa a eles e que eles não podem viver essa realidade, imposta pelo MEC, de falta de apoio do ente federativo mais forte (a União). Eles precisam entender que o SNE será uma verdadeira revolução na diminuição dos gastos irracionais e na equalização das redes – que são muito diferentes entre si, então precisamos induzir desenvolvimento de redes mais pobres. Só assim nós vamos virar esse jogo.
Mas também queremos atingir estudiosos e pesquisadores da área e, claro, quem está na base, ou seja, os gestores escolares e o próprio professorado – como os meus alunos, que geralmente trabalham na área de pesquisa em educação ou são docentes das escolas públicas do Distrito Federal, onde atuo.
Portal Cenpec: Quais as perspectivas de tramitação da matéria neste segundo semestre de 2022?
Deputado Professor Israel Batista: O PLP 235 – do senador Flávio Arns e relatoria do senador Dário Berger – foi aprovado por unanimidade no Senado. Aqui na Câmara, foi apensado a ele o PLP 25/2019, da deputada Professora Dorinha Seabra, e o PLP 216/2019, da Professora Rosa Neide.
Estamos à espera de que o presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira aponte um relator – e o nome natural para essa relatoria é o deputado Idilvan Alencar, que era relator do PLP 25/2019. Mas nós estamos com um impasse político, porque por algum motivo, que não é declarado, o presidente Lira não tem levado isso adiante. Nós sabemos que o MEC tem jogado contra, não quer que isso aconteça e, por isso, há um profundo alinhamento – a meu ver até inadequado – entre a presidência da Câmara e o governo.
É realmente inaceitável – e até um desrespeito com o Senado – que um projeto que tenha sido aprovado naquela casa por unanimidade não tenha nenhum andamento e esteja dentro da gaveta da Presidência.
Temos conversado com o presidente Lira, mas ele não tem nos dado um retorno sobre esse assunto. O senador Dário Berger também deve conversar com ele sobre o assunto em agosto. Parece-me que ele ainda não compreendeu a importância desse assunto e de como ele entraria para a história caso a legislação do SNE seja aprovada sob a sua gestão.
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