APC: aprendizados para integração com a comunidade

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APC: aprendizados para integração com a comunidade

Webinário promovido pelo Cenpec, Conisul Alagoas e Itaú Social abordou educação integral e integração com a comunidade como fundamentais para avançar na formação de equipes e apoiar a recomposição de aprendizagens

por Débora Britto

Quão desafiadora e necessária é a integração com a comunidade na escola em que você atua?

Para o professor Braz Nogueira, apesar de todos os desafios, a integração foi a chave para abrir portas, derrubar muros e transformar a escola numa referência para toda uma comunidade. No caso, a comunidade é Heliópolis, considerada a maior favela de São Paulo. Ex-diretor da Escola Municipal Campos Salles, Braz foi um dos grandes responsáveis por transformar a comunidade de Heliópolis em um bairro educador. Além da aproximação entre a escola e a comunidade, sua gestão escolar foi marcada pelo investimento em uma relação dialógica entre estudantes e educadoras(es).

No último dia 05/12, o educador compartilhou sua experiência no Webinário “Educação Integral e a comunidade: derrubando os muros da escola”, como parte do fechamento das atividades promovidas ao longo do ano do Apoio Pedagógico Complementar (APC). O APC atua em 17 municípios do Consórcio Intermunicipal do Sul do Estado de Alagoas (Conisul), onde também é conhecido como programa Eleva Aprendizagem. O projeto é resultado de uma parceria entre o Itaú Social, Conisul e Cenpec.

“A escola é única, assim como uma pessoa”. Essa frase marcou o início da partilha de Braz Nogueira, que convidou o público composto por professoras, pontos focais, técnicas, formadores(as) e gestores(as) a não copiar, mas a se inspirar na experiência que ele teve como diretor da Escola Municipal de Ensino Fundamental Presidente Campos Salles, localizada em Heliópolis. “Não tem como copiar o projeto de uma escola para a outra, mas o que é possível é que seja inspiração para outras experiências”, complementa. 

Em termos muito simples, dois pontos orientam o pensamento e os aprendizados compartilhados por Braz: tudo passa pela educação e a escola precisa ser um ponto de referência. 

Para ele, é preciso pensar na educação não apenas na escola, dentro da sala de aula, mas uma educação maior. Fato que ele descobriu na prática, depois de realizar por anos trabalhos com pais e mães de estudantes.

A segunda questão central que ele traz como aprendizado é que a escola precisa ser um ponto de referência, de liderança na comunidade e ela precisa se conectar com outras lideranças da própria comunidade e território onde estão inseridos. 

Quando a gente está em um momento difícil de ter que entender que rumo tomar, temos que olhar para dentro da gente e encontrar uma âncora para desenvolver um trabalho de integração das pessoas. Eu encontrei os dois pontos, a educação que atravessa tudo e a escola como um centro de referência para a comunidade. A partir daí eu tracei um plano de trabalho em que eu deveria me conectar com todos os integrantes, todos os segmentos de estudantes, professores, trabalhadores da escola que não estão na sala de aula, dos pais, de lideranças comunitárias, do entorno para defenderem essas ideias como se fossem deles também”, relata. 

No enfrentamento à violência que atingiu a comunidade escolar, Braz, como diretor, se viu no papel de mobilizar professores(as) e lideranças comunitárias para resistir ao clima de medo e terror que assolava o território nos idos da década de 90. O resultado do trabalho deu origem à Caminhada da Paz em Heliópolis, realizada pela primeira vez em 1999, que hoje segue para a 26ª edição.   

“Aos poucos, conseguimos unir muita gente e fomos criando um grupo cada vez maior. Esse grupo começou a se fortalecer e ter o poder de criar, de transformar e de mudar e colocar a escola como porta de entrada para Heliópolis”, conta. 

A partir dos ensinamentos da experiência em São Paulo, os municípios do Conisul de Alagoas puderam ter mais repertório e experiências para se inspirar.  Érica Catalani, coordenadora do APC pelo Cenpec, aponta que um dos grandes aprendizados é enxergar a escola como um espaço em que é preciso existir colaboração entre a comunidade. 

Foto: acervo pessoal

O webinário foi uma construção coletiva e contou com a colaboração intensa das pessoas que participaram da construção de uma educação de qualidade com equidade nos municípios do cone sul de Alagoas. O Professor Braz nos presenteou com sua história de vida, um testemunho do quanto a escola pode ser uma potência quando trabalha em conjunto com a comunidade, derrubando os obstáculos enfrentados em territórios de populações mais vulneráveis. Entendo que ele nos deixa um importante recado: a escola é um espaço que se constrói em colaboração onde os problemas, as responsabilidades e as lideranças devem ser partilhados”, reflete. 

Érica Catalani

O Webinário completo com a fala do professor está disponível no Youtube do Cenpec e pode ser assistido aqui: 

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Para Aline Tiemi Yokoyama, técnica de projetos do Apoio Pedagógico Complementar, o webinário foi também um momento de celebração pelo trabalho realizado pelos 17 municípios do Conisul desde 2021 com o APC. 

Foto: acervo pessoal

Contamos com a participação de Dirigentes Municipais, técnicas(os) de Secretarias, professoras(es) e gestores(as) escolares. Essa representação diversificada foi crucial, especialmente considerando que o tema central do evento foi a valorização da integração com a comunidade escolar para assegurar uma educação integral. A escola é um espaço que prepara estudantes para viverem e atuarem no mundo real, e a fala do professor Braz corroborou neste sentido, trazendo para dentro da escola as múltiplas realidades que os estudantes vivem, seus contextos e origens, tornando a escola mais instigante e significativa”, celebra. 

Aline Tiemi Yokoyama

Camila Arelaro, tutora do APC e que foi mediadora do webinário, comemorou o sucesso da transmissão, que teve mais de 500 visualizações, quase 200 comentários e a participação, com espaço de fala, de todos os municípios que compõem o Conisul Alagoas.

Foto: acervo pessoal

A participação do professor Braz foi sem dúvida um grande acerto, a experiência e trajetória do professor na construção do bairro educador contribui muito e nos inspira para pensarmos a escola integral que queremos, essa que derruba os seus muros em relação aos preconceitos e inclui a diversidade e a comunidade em seu currículo, é uma escola viva, feita por todos e todas, que pensa o aluno como um cidadão de direitos, uma escola com qualidade, com formação permanente de professores e professoras, feita com diálogo e na troca de experiências, numa construção coletiva, e com gestão democrática”, comenta. 

Camila Arelaro

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Avanços na integração e autonomia das equipes

Aline também destaca que a participação e engajamento das equipes e pontos focais foi um momento fundamental para o Webinário, que mostra o enraizamento e compromisso com o APC. “Os relatos trouxeram a voz de pontos focais, mas também de professoras(es) e formadoras(es) que reconhecem os impactos do APC no dia a dia da sala de aula. Foi possível notar o quanto as equipes estão apropriadas do programa e o quanto o APC ocupa hoje um espaço importante dentro das estratégias para a garantia da aprendizagem para estudantes dos municípios numa perspectiva integral”, analisa. 

Na avaliação de Camila, este ano encerra com muitos avanços em relação às práticas dos professores e professoras nas atividades de recomposição de aprendizagem. Ao longo da trajetória do APC, este momento era bastante esperado e agora rende frutos. “As formações chegaram até o território das escolas em muitos municípios, ou seja, elas foram significativas para quem está em sala de aula, fizeram sentido e enriqueceram o repertório desses profissionais, que sem dúvida são os mais cobrados na hierarquia da educação, e no atendimento para a superação das dificuldades dos alunos e alunas”, explica. 

“Foi um ano de grandes esforços de colaboração: na elaboração e monitoramento dos planos de ação, no planejamento e realização dos percursos formativos para professores e professoras, no envolvimento de gestores na tutoria, na consolidação dos diagnósticos e acompanhamentos das aprendizagens e do atendimento complementar aos(às) estudantes dos anos iniciais”, complementa Érica.  

É natural que, com o passar do tempo, as(os) pontos focais se apropriem melhor das estratégias, aprofundem vínculos e se empoderem para a implementação do programa. Por isso, neste terceiro ano de parceria, pudemos alcançar muitos avanços e conquistas. Entre eles, destaco o fortalecimento do senso de colaboração entre os municípios; o desdobramento das formações que o APC proporcionou para pontos focais, de modo que planejaram e conduziram as formações para as(os) professores dos seus municípios autonomamente; e a sistematização dos dados de avaliação dos municípios em uma plataforma virtual de fácil acesso, facilitando a gestão municipal dos dados educacionais numa perspectiva comparativa desde 2022. A implementação de um programa se faz a muitas mãos, e é bonito ver o quanto avançamos ao longo desses anos juntos”, analisa Aline. 

Aline Tiemi Yokoyama, técnica de projetos do Apoio Pedagógico Complementar

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Fortalecimento e enraizamento do projeto

Ao olhar para os últimos anos de implantação do programa, a coordenadora do APC avalia que este terceiro ano de experiência do APC reúno muitos avanços, com destaque para a melhoria das aprendizagens, que podem ser monitoradas por um painel construído para este fim. 

Foi possível obter maiores informações sobre o perfil dos(as) estudantes, mapeando as condições socioeconômicas, da trajetória escolar e as preferências no âmbito escolar. São  informações fundamentais para o mapeamento e melhor compreensão das experiências escolares, permitindo acompanhar a diminuição das desigualdades educacionais. Essa mobilização já começou o trabalho de autonomia das equipes técnicas nas ações de 2023, mas terá foco mesmo nas ações previstas para 2024, onde potencializaremos os processos de avaliação dos resultados do programa e sua continuidade”, explica.

Érica Catalani, coordenadora do APC pelo Cenpec

Como tutora que acompanhou o desenvolvimento dos planos de formação e de ação ao longo deste ano, o que mais chamou atenção de Camila na trajetória do APC foi o fortalecimento e organização das(os) profissionais das secretarias de educação:

Cada município tem suas especificidades e cada um tem conquistado maior autonomia para atuar para que as escolas tenham uma relação mais próxima com a secretaria, isso é muito importante, o sucesso das escolas é o sucesso das secretarias de educação.  Mas, a organização de cada secretaria em relação ao acompanhamento e entendimento de cada escola, sabendo como cada escola atua, as complexidades, as características, as necessidades, e, sem dúvida a aproximação e o entendimento das dificuldades de cada aluno e aluna, essa justaposição entre os atores das redes de educação foi algo interessante e potente que começou a ser construído. Algo fundamental, no meu entendimento, para o fortalecimento do Conisul educação e para a qualidade da educação em cada município”, explica.

Camila Arelaro, tutora do APC

Érica também observa uma maior autonomia da Câmara Técnica do Conisul, principalmente no acompanhamento das ações do programa e na mobilização das ações nos municípios, fomentando a colaboração entre eles.

Para 2024, o APC terá ações concentradas no primeiro semestre, em razão das eleições municipais no segundo semestre. Segundo Érica Catalani, o foco será em consolidar o processo de monitoramento e avaliação do programa, com um olhar específico para as mudanças ocorridas no acompanhamento das aprendizagens do território, sobretudo em relação ao plano de formação de professores(as) e em relação ao atendimento e aprendizagens dos(as) estudantes. Pretende-se intensificar a colaboração dos territórios, estimulando a construção do memorial e fortalecendo ainda mais a implementação autônoma do programa por parte das equipes técnicas. 


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