Desafios e boas práticas da alfabetização no pós-pandemia

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Desafios e boas práticas da alfabetização no pós-pandemia

Acolher, trazer a família para perto, entender qual é o real problema e trabalhar diferentes estratégias pedagógicas e enturmações são algumas das ações que as escolas precisam focar para garantir a aprendizagem de todos e todas

Por Stephanie Kim Abe

Desde o começo do ano, o espaço de prosa virtual do Programa Escrevendo o Futuro chamado Pergunte à Olímpia, aberto para que educadoras e educadores de todo o Brasil possam expor as suas dúvidas e conversar sobre práticas de ensino da leitura e da escrita, tem recebido mensagens tais como essas abaixo:

Cenpec/Itaú Social – Programa Escrevendo o Futuro

Os depoimentos de educadoras(es) dão voz a uma situação que é comprovada pelos dados educacionais: o impacto da pandemia para as(os) estudantes em alfabetização

De acordo com o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) 2021, a proficiência média dos estudantes do 2o ano do ensino fundamental em língua portuguesa caiu 24,5 pontos de 2019 para 2021 (de 750 para 725,5). Espera-se que as crianças estejam alfabetizadas nessa idade escolar, porém o percentual de crianças do 2o ano que não sabem ler e escrever dobrou: passou de 15% para 34%. Isso significa que, pela amostra da edição, quatro em cada dez crianças que fizeram a avaliação em larga escala não conseguem ler palavras

Saiba mais sobre os dados do Ideb e do Saeb 2021 aqui

Olhar com atenção para essa situação e planejar ações efetivas para combater esses índices e recompor as aprendizagens dessas(es) estudantes é fundamental para que toda a trajetória escolar delas(es) não seja prejudicada

Como explica Maria Alice Junqueira, coordenadora de projetos do Cenpec e especialista em alfabetização: 

Foto: acervo pessoal

Ler e escrever é o que abre a porta para que o estudante possa então compreender todas as outras disciplinas. Se você não der conta de abrir essa primeira porta, a frustração é muito grande e todo o processo de aprendizagem fica prejudicado”. 

Maria Alice Junqueira, coordenadora de projetos do Cenpec e especialista em alfabetização

Além disso, esse é um assunto que interessa a todas e todos da comunidade escolar, não só às(aos) professoras(es) alfabetizadoras(es), já que a alfabetização tardia respinga nos demais anos escolares.

Precisamos de uma discussão séria e consistente nas escolas e redes de ensino sobre como acolher as crianças e suas famílias e criar um ambiente emocional adequado para que desenvolvam o prazer de aprender. Muito importante é não culpabilizar as famílias — e nem os estudantes — por possíveis defasagens na aprendizagem, lembrar sempre que muitos foram afetados pelas desigualdades sociais e econômicas que já existiam, mas se aprofundaram no período da pandemia e que afetaram de formas diversas as possibilidades de acesso ao ensino remoto. Será preciso fazer diagnósticos bem elaborados e, a partir dos resultados obtidos, planejar diferentes estratégias para mitigar o impacto que o período de ensino não presencial teve no processo de alfabetização de tantos estudantes”. 

Maria Alice Junqueira


✏️ Entendendo o contexto 

🔎 Em qual ano estão essas(es) estudantes não alfabetizadas(os)?

Antes de mais nada, é preciso situar as(os) estudantes quanto à série em que estavam cursando durante o ensino remoto, pois foram afetadas(os) de maneira diferente e se encontravam em estágios diferentes do processo de alfabetização.

Os resultados do Saeb 2021 mostram que a fase mais afetada é aquela dos estudantes que estavam saindo da educação infantil ou no 1o ano do ensino fundamental durante a pandemia — ponto crucial no processo de alfabetização.

Esses são exatamente as(os) estudantes cujo processo de alfabetização foi conduzido à distância, e aconteceu do jeito que deu, da forma como foi possível: seja por aulas remotas ou por meio de “folhinhas impressas” de atividades que a escola fazia chegar às mãos das famílias.

Especialistas já apontavam o quão prejudicial o ensino remoto seria para as crianças nessa etapa, como explica Alice:

De acordo com a BNCC, é no 1º e no 2º ano que se espera que a criança se alfabetize e amplie a sua participação em eventos de letramentos. É quando a mediação do professor e a troca com os colegas é fundamental para que a criança avance em seu processo — exatamente o que não pôde ser oferecido com o fechamento das escolas para as aulas presenciais. Então, o que ocorreu é que esses estudantes não concluíram, ou não concluíram bem o seu processo”.”. 

Maria Alice Junqueira, coordenadora de projetos do Cenpec e especialista em alfabetização

Há, também, aquelas(es) estudantes que estavam no final da alfabetização, por exemplo, no 3o ano do ensino fundamental em 2020. Essas(es) deveriam estar já plenamente alfabetizadas(os), porém não estão.  

“Hoje, esses alunos estão no 4o ou 5o ano e ainda apresentam dificuldades na produção de textos orais e escritos e na leitura. Esse, aliás, não é um fenômeno novo no Brasil. Infelizmente, é uma realidade que já existia, mas que estávamos caminhando, pouco a pouco por meio de políticas públicas, para uma melhoria. A pandemia vem desestabilizar essa curva ascendente e aprofundar as desigualdades novamente, revela Alice. 

🔎 Qual é, de fato, a dificuldade?

Ao longo da alfabetização é importante proporcionar aos estudantes oportunidades e experiências que possibilitem a ampliação dos letramentos e, para tanto, é preciso desenvolver práticas de linguagem nos quatro eixos contemplados na BNCC: oralidade, leitura/escuta, produção de textos e análise linguística/semiótica.

Ou seja, a afirmação “meu aluno não está alfabetizado” é só a ponta do iceberg e, na verdade, não diz muita coisa. É preciso entender em que ponto, de fato, a(o) estudante está em relação a esses diferentes eixos, o que significa entender que habilidades ela(e) já desenvolveu e quais ainda precisam ser consolidadas.

Existem muitas gradações na alfabetização. O aluno não entendeu como funciona o sistema de escrita alfabético, por exemplo, que a escrita representa a fala? Se o problema está aqui, é preciso desenvolver um trabalho para que ele se aproprie desse funcionamento em primeiro lugar — o que não significa que não seja importante continuar desenvolvendo habilidades relativas aos outros eixos”, explica.

Maria Alice Junqueira, coordenadora de projetos do Cenpec e especialista em alfabetização

Isso significa que é preciso continuar trabalhando os quatro eixos. Nesse sentido, a(o) docente pode planejar situações de produção de textos orais e escritos, ou de leitura para ajudá-la(o) a avançar nisso, tendo em conta que tal estudante ainda não compreendeu o funcionamento do sistema de escrita. Ela(e) pode, por exemplo, ser uma(m) boa(m) produtora(r) de textos desde que possa ditá-lo para um(a) escritor(a) mais experiente grafá-lo, como por exemplo a professora, ou um colega que já saiba escrever convencionalmente.

Em um outro caso, pode ser que a(o) estudante já domine o funcionamento do sistema de escrita alfabético, mas apresente muitas questões ortográficas. Ela(e) escreve, por exemplo, “aparesser” em vez de “aparecer”.

“Já vi, algumas vezes, em casos como esse, os professores dizerem que o aluno não está alfabetizado. Nesse exemplo, a criança já compreendeu que a escrita representa a fala, mas ainda precisa se apropriar de questões relativas à ortografia e, desse modo, as habilidades que precisam ser desenvolvidas são outras, comparando com o exemplo anterior. Nenhum dos dois concluiu a alfabetização, mas suas necessidades são distintas, portanto as intervenções pedagógicas devem ser diferentes também“, explica Alice.

Em uma outra situação, pode ser que a criança já seja capaz de produzir textos em escrita alfabética, mas apresente dificuldades para planejar a escrita considerando as características de determinado gêneros textual.

Nesse caso, a(o) docente pode centrar esforços no desenvolvimento de uma sequência didática, na qual a criança terá a oportunidade de ouvir a professora ler em voz alta, ou de ler por si mesma, diversos textos pertencentes a esse gênero e, depois, ser convidada a fazer a sua própria produção de um texto desse gênero. “É importante lembrar que essa proposta deve acontecer num contexto que faça sentido para o aluno(a). Dá para perceber que já é um outro trabalho, né?”, aponta Alice.

Na verdade, desde a educação infantil, esse trabalho da professora de ler em voz alta textos de diferentes gêneros textuais, por exemplo, como contos de fadas ou notícias, já está presente. É por isso que é muito comum vermos crianças que nem estão alfabetizadas ainda “lendo” histórias, pois elas a contam como se estivessem realmente lendo.

Elas se colocam no lugar de leitor, por meio da voz do professor, da família, dos irmãos mais velhos — e isso significa que elas já se apropriaram do modo de dizer daquele gênero textual que se tornou conhecido para ela. Essa é uma importante situação pedagógica no processo de alfabetização. Porém, durante a pandemia, muitas crianças — principalmente as mais desfavorecidas —, não tiveram esse contato com a leitura, seja porque não têm livros em casa, seja porque os pais não lêem livros com elas, seja porque o ensino remoto não chegou até elas ou ocorreu de forma precária. É papel da escola colocar as crianças em contato com esses diferentes textos neste momento”, diz Alice. 

Independentemente do ano escolar da(o) estudante, é importante entender essas gradações e fazer um bom diagnóstico, para então poder desenvolver, junto com a(o) coordenadora(r) pedagógiga(o), um plano de trabalho potente para desenvolver as habilidades que não foram consolidadas.

🔎 Qual o papel da professora nesse processo? 

Alice ressalta que, ainda que a pandemia tenha impactado mais as famílias mais vulneráveis, o impacto do ensino remoto na alfabetização afetou estudantes das escolas públicas e privadas

Mesmo muitas crianças que puderam contar com o acompanhamento dos pais durante as aulas remotas e que conseguiram se alfabetizar quando se encontravam no primeiro ano em 2020 — e hoje estão cursando o 3º ano — apresentam uma produção escrita (ao produzir textos) esperada para final de 1º ano, por exemplo. E nós, especialistas, temos visto isso tanto nas redes públicas quanto nas escolas privadas”.

Maria Alice Junqueira

Com atividades impressas enviadas para casa ou levadas por professoras(es) da escola ou mesmo atividades on-line, não houve uma mediação da(o) educadora(r) com o estudante em alfabetização. Na educação infantil, por exemplo, o trabalho de letramento se inicia aos poucos, por meio de atividades como brincadeiras com sons da língua, aproximação da cultura escrita e da leitura por meio de um trabalho direcionado etc. E é a(o) docente a(o) profissional que possui os conhecimentos técnicos e teóricos para conduzir a criança durante essas atividades em uma progressão na alfabetização.

A mediação na aprendizagem é um dos pontos mais importantes e dramáticos na alfabetização. Você precisa entender o nível de apropriação da língua escrita, da leitura e da produção escrita em que a criança se encontra para fazer as perguntas que a fazem avançar. Além disso, é preciso entender os equívocos nas suas respostas. Ela respondeu ‘errado’? Mas qual era o raciocínio que estava por trás desta resposta ‘errada’ que ela deu? São necessárias(os) alfabetizadoras(es) muito bem preparadas(os) para fazer isso, pois é um trabalho para profissionais. É por isso que as(os) professoras(es) estudam tantos anos”.

Maria Alice Junqueira


✏️ Planejando o trabalho

📌 Quais os primeiros passos?

Antes de mais nada, é preciso acolher de fato as(os) estudantes — o que significa entender o que elas(es) enfrentaram durante o período remoto e as suas dificuldades. Essa etapa de retorno às escolas tem sido muito discutida por especialistas há pelo menos um ano. 

Mas, para Alice, esse acolhimento não tem acontecido nas escolas como deveria:

As crianças voltaram e estão voltando diferentes para a escola, mas a instituição não tem recebido essas(es) estudantes de forma diferente. Ela não tem levado em consideração que estar no 5o ano e ainda não saber escrever e ler é uma frustração muito grande para as(os) alunas(os), sua família e suas(seus) professoras(es)”. 

Maria Alice Junqueira, coordenadora de projetos do Cenpec e especialista em alfabetização

Por isso ela reforça a importância de se criar um clima escolar que fortaleça a(o) estudante sobre a sua própria capacidade — afinal, todo mundo pode aprender — e não o estigmatize ou reforce desigualdades:

A escola não pode colocar a culpa no estudante e tampouco em sua família pelas condições em que vivem e que talvez não tenham sido as melhores para aprender remotamente. Enquanto a gente não fizer esse trabalho de recomposição das aprendizagens junto com o trabalho de construção de um bom clima emocional de acolhimento, vamos continuar tendo dificuldades para abrir a porta da alfabetização para essas(es) estudantes”.

Maria Alice Junqueira

📌 Quais as bases do planejamento do trabalho pedagógico?

Nenhum plano de trabalho será efetivo se não estiver fundamentado em um bom diagnóstico. 

Infelizmente, o processo de avaliação diagnóstica tem ocorrido de forma muito irregular no Brasil, com as redes de ensino enfrentando as suas dificuldades nesse processo da forma que tem encontrado, sem uma coordenação nacional que pudesse direcioná-las nesse percurso:

O Ministério da Educação proporcionou, somente há pouco tempo, uma plataforma com instrumentos bastante confiáveis elaborados pelo CAED para realizar e tabular os dados de diagnóstico, o que foi bom. No entanto, não traz subsídios para análise desses resultados — o que é muito importante, para então se criar um plano de ação”, explica Alice.

Há municípios e estados que procuraram se organizar melhor com o apoio de organizações da sociedade civil, como redes municipais que participam do Programa Apoio Pedagógico Complementar, Parceria pela Valorização da Educação e Programa Impulsionar (todos projetos que têm participação do Cenpec).


Dicas do Programa Escrevendo o Futuro

O Programa Escrevendo o Futuro promoveu a live Avaliação diagnóstica da produção escrita no Ensino Fundamental II, em 26 de maio, com mediação de Patrícia Calheta, colaboradora do Programa Escrevendo o Futuro, e participação de Clecio Bunzen, professor do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). 

A conversa rendeu muitas dicas de como realizar o processo de avaliação diagnóstica para as(os) estudantes dessa etapa. Confira abaixo:


Além disso, é preciso sempre ter em mente, durante o processo de planejamento do trabalho, que as(os) estudantes se encontram em momentos diferentes da apropriação do sistema de escrita, da produção de texto e da leitura. Isso significa que as propostas pedagógicas precisam estar de acordo com os interesses dessas(es) estudantes, em um movimento que olhe para frente, para o que ele está aprendendo em sua atual série, e não para trás:

Não esqueçamos que alfabetizar um menino de 12 anos é diferente de um de sete anos. Ou seja, precisamos manter os princípios da alfabetização mas usar outros materiais, trazendo conteúdos interessantes para a faixa etária em que ele se encontra. Por exemplo, em vez de trabalhar com histórias em quadrinhos, posso utilizar mangá. Em vez de quadrinhas e versinhos, posso trazer ditos populares ou letras de músicas de que as crianças gostam”, explica. 

Maria Alice Junqueira, coordenadora de projetos do Cenpec e especialista em alfabetização

Veja como potencializar a recomposição da aprendizagem pós-pandemia

📌 Quais boas práticas podem ser mais efetivas?

Não há fórmulas prontas para lidar com a alfabetização tardia, já que cada escola e rede de ensino tem suas particularidades, que variam em termos de disponibilidade do corpo docente, estrutura e capacidade física, regras burocráticas, questões territoriais e mesmo da situação das turmas no processo de letramento. 

“As redes precisam ter bastante conhecimento das suas questões burocráticas e, a partir delas, pensar com criatividade e flexibilidade sobre as diferentes estratégias que podem lançar mão para potencializar a recomposição das aprendizagens na alfabetização dos diferentes estudantes”, aponta Alice. 

Apostar em diferentes enturmações, reorganizar as turmas e utilizar o contraturno, e remanejar o corpo docente para que as(os) melhores professoras(es) alfabetizadoras(es) estejam à frente do trabalho com as turmas que mais precisam são algumas das estratégias que a especialista aponta como potentes — e que algumas redes já têm utilizado

Costuma ser mais difícil para as(os) professoras(es) dos anos mais avançados trabalhar com a alfabetização, porque elas(es) não estão acostumadas(os). Espera-se que as(os) suas(seus) estudantes já estejam alfabetizadas(os) — e por isso elas(es) ficam mais perdidas(os) quando se encontram diante desse desafio. Por isso, reorganizar o corpo docente e as turmas pode ser uma boa opção. É difícil esperar que essas(es) profissionais do 5o, 6o ano se tornem alfabetizadoras(es) — mas, mesmo assim, é preciso formação continuada sobre esse processo para todas(os) as(os) professoras(es) que estiverem envolvidas(os), de alguma forma, na alfabetização destas(es) estudantes, enquanto for necessário”, explica. 

Maria Alice Junqueira, coordenadora de projetos do Cenpec e especialista em alfabetização

As estratégias utilizadas por Ribeira do Pombal (BA)

A rede municipal de Ribeira do Pombal, município de menos de 60 mil habitantes no nordeste da Bahia, tem apostado em algumas das estratégias listadas acima para potencializar a alfabetização dos seus estudantes, e que fazem parte de um projeto de recomposição de aprendizagens, chamado Peraê. 

Após uma avaliação diagnóstica, as(os) estudantes do 3o, 4o e 5o ano foram reagrupadas(os) em três grupos diferentes, independentemente do ano em que estavam matriculadas(os): inicial, intermediário e adequado, sendo que a cada turma foi designado um professor alfabetizador da rede.

Foto: acervo pessoal

A professora Maria Suzinete Damião Santos, que costuma dar aulas para o 3o ano na escola municipal Joana Angélica, acabou sendo designada para a turma de iniciantes. “Eu recebi crianças do 4o e 5o ano na minha sala que ainda estavam no nível silábico”, relata. 

Foi preciso adaptar os materiais e planejar suas aulas de forma a garantir o interesse de todas(os) as(os) estudantes

Eu não posso deixar minhas aulas muito infantilizadas, de forma a não chamar atenção das crianças maiores. Assim, com foco em leitura e escrita, temos utilizado sequências didáticas e poemas com esses estudantes. Agora, estamos também usando contos de fadas, e a ideia é que haja uma encenação para as famílias depois. Dessa forma, não ficamos restritas a atividades mecânicas apenas, mas propomos tarefas que realmente envolvam as crianças. Afinal, cada uma aprende de sua própria forma e no seu próprio ritmo”, diz. 

Em paralelo, a secretaria tem realizado ciclos formativos, de forma a apoiar as(os) professoras(es) nesses desafios de adaptação das atividades e de demais dúvidas pedagógicas que possam surgir. 

Para apoiar os professores em suas dificuldades quanto à compreensão das estratégias para o processo de alfabetização, nós realizamos formações com temáticas como psicogênese da língua escrita, consciência fonológica, alfabetização científica, alfabetização matemática, metodologias ativas e agrupamentos produtivos”.

Elãine Cristina Silva dos Santos, coordenadora pedagógica da Secretaria Municipal de Educação de Ribeira do Pombal.


📌 Como alinhar expectativas com a família?

Na visão de muitas(os) educadoras(es), a pandemia fortaleceu os laços entre a família e a escola, já que requisitou que ambos atores trabalhassem mais próximos em prol da aprendizagem das crianças e dos adolescentes durante o ensino remoto. 

Essa parceria deve — e precisa — se manter também no pós-pandemia. 

Através de projetos como o Letra Móvel, em que apoiamos estudantes de uma escola da periferia de São Paulo em seu processo de alfabetização por meio de dispositivo móvel durante a pandemia, percebemos a potência dessas duas instituições trabalharem juntas. Principalmente no caso das famílias que vivem em territórios vulneráveis, que muitas vezes não estão apropriadas do direito que suas crianças têm de aprender. Isso faz parte da ideia de criar um bom clima escolar”. 

Maria Alice Junqueira, coordenadora de projetos do Cenpec e especialista em alfabetização

Saiba mais sobre a experiência do Letra Móvel

No município de Ribeira do Pombal (BA), foram estipuladas datas específicas para realizar encontros com as famílias dos estudantes. Eles têm sido utilizados para manter esse vínculo entre a família e a rede de ensino, explicar o funcionamento do projeto Peraê e alinhar expectativas:

Queremos que as famílias colaborem com esse processo e entendem que aquele aluno do 5o ano que não está alfabetizado ainda precisava ir para um outro agrupamento, com estudantes do mesmo nível que ele que talvez fossem de séries abaixo. Esse momento de sensibilização foi importante para que eles não se sentissem inferiorizados, e as próprias famílias já nos contaram que viram avanços no processo de alfabetização das suas crianças”, explica Elãine. 

📌 Garantindo o direito de todas e todos

Para Alice Junqueira, não contar com uma coordenação nacional que ajude as redes de ensino nesse processo é um agravante e uma frustração. Mais do que isso, as políticas de alfabetização implementadas no atual governo de Jair Bolsonaro seguem na direção contrária às que estavam sendo realizadas nos últimos 30 anos.

A Política Nacional de Alfabetização (PNA), por exemplo, instituída por decreto pelo governo Bolsonaro em abril de 2019, apresenta aspectos que divergem das principais normativas nacionais, como o Plano Nacional de Educação (PNE), a Constituição e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

“Ou seja, apesar de uma das poucas medidas realizadas pelo MEC neste governo ter sido investir em políticas nacionais de alfabetização, nos encontramos nessa situação de defasagem de aprendizagem dos estudantes. Isso mostra como elas não foram efetivas e trouxeram retrocesso e aprofundamento das desigualdades”, diz Alice. 

Entenda mais as divergências entre a Política Nacional de Alfabetização e a BNCC

A especialista acredita que é imprescindível que esse apoio às redes de ensino ocorra no ano que vem, de forma a ajudá-las a se organizar no processo de alfabetização. 

“Este não é um trabalho fácil e rápido: pesquisas apontam que levaremos alguns anos para recompor essas aprendizagens, principalmente quando falamos de alfabetização. Mas, qualquer que seja o tamanho desse problema, precisamos alfabetizar, esteja este estudante no 2o, 5o ou 8o ano. Toda criança tem o direito de aprender e pode aprender a ler e escrever. É direito de todos estar plenamente alfabetizados, e a escola precisa proporcionar isso para todos os seus cidadãos”, diz Alice. 


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