Dia da Consciência Negra: entenda as origens, as razões e conheça os propositores da data
De 19 a 24/11, redes sociais trazem materiais sobre cultura afro-brasileira e diversidade étnico-racial
Por João Marinho
Hoje, 20 de novembro, comemora-se o Dia da Consciência Negra, instituído em todo o Brasil por meio da Lei n.º 12.519/2011. Mais do que instituída pela legislação, porém, a data tem uma história, que guarda relação com o crescimento do movimento negro no Brasil, reconhecimento da contribuição dos negros à cultura nacional e luta contra estruturas racistas que permanecem vigentes no País.
História de resistência
A origem do Dia da Consciência Negra pode ser traçada até os anos 1960. Na época, a única data oficial que fazia referência direta ao histórico das etnias negras no Brasil era o 13 de maio, Dia da Abolição da Escravatura.
Em entrevista ao portal Geledés, o poeta, pesquisador e professor Oliveira Ferreira da Silveira – falecido em 2009 – relata que havia negros insatisfeitos com essa situação. No final da década de 1960, Silveira pesquisava o protagonismo de mulheres e homens negros no Rio Grande do Sul, de onde era originário, e no Brasil. Acabou por reunir um grupo de interessados que frequentava a Rua dos Andradas, no Centro histórico de Porto Alegre, citada na obra de Mario Quintana – e onde outros grupos de negros já se encontravam para troca de ideias e análises sobre sua situação. “Achávamos que a comemoração […] homenageava uma princesa ‘portuguesa’ e não o povo negro. Daí percebi que era preciso encontrar uma data que fizesse justiça à luta continuada dos negros brasileiros”, disse Silveira à repórter Fernanda Pompeu.
Entre os negros que iam à Rua dos Andradas, o grupo que costumava se reunir em frente à loja Masson, do qual Silveira participava, destacou-se na história do Dia da Consciência Negra. Nesse grupo, uma das principais discussões girava em torno da postura frente ao 13 de maio, tendo Jorge Antônio dos Santos, o Jorge do Xangô, como principal fomentador e opositor às comemorações realizadas na data.
Em 1971, durante o governo linha-dura de Emílio Garrastazu Médici, Oliveira Silveira, então professor de Letras, fundaria com Antônio Carlos Cortes, estudante de Direito; Ilmo da Silva, estudante de Economia; e Vilmar Nunes, estudante de Administração e funcionário do Ministério da Agricultura, um grupo de militância negra que homenageava o Quilombo dos Palmares. Localizado no estado de Alagoas, o Quilombo dos Palmares entrou para a história não apenas pelo tamanho – no auge, chegou a abrigar mais de 25 mil negros que fugiam da escravidão –, mas também pela duração, cerca de 100 anos. Localizado em uma área de solo rico, adotava táticas de guerrilha, comércio com fazendeiros da região e assaltos para se manter e resistir ao assédio das tropas coloniais.
Instituição da data e reconhecimento
O Grupo Palmares de Porto Alegre teve sua primeira reunião oficial em 2 de julho de 1971 e existiu até 1978. Desde o começo, estruturou-se em torno de uma proposta alternativa ao 13 de maio.
A pesquisa daí resultante, realizada por Oliveira Silveira, o fez encontrar a data da morte de Zumbi, 20 de novembro de 1695. Líder histórico do Quilombo dos Palmares, Zumbi, cuja data de nascimento é desconhecida, foi assassinado durante a invasão do quilombo por tropas coloniais, após ser traído por Antônio Soares, um de seus capitães.
Logo no primeiro ano, o grupo gaúcho propôs o dia 20 de novembro como mais representativo de uma libertação que havia ocorrido como conquista, resultado da luta e resistência dos negros, e não como algo “concedido” pelo governo imperial na pessoa da princesa Isabel. A história do Palmares de Porto Alegre pode ser consultada na dissertação do mestre em história pela PUC-RS, Deivison Moacir Cezar de Campos.
Em 20 de novembro de 1971, no Clube Náutico Marcílio Dias, frequentado por negros porto-alegrenses, foi realizada uma homenagem a Zumbi dos Palmares, da qual participaram 20 pessoas. Ao longo do tempo, a iniciativa ganhou espaço e popularidade e, sete anos depois da primeira homenagem, recebeu o nome de Dia da Consciência Negra por ideia do ativista Paulo Roberto dos Santos, durante uma assembleia do Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial (MNUCRD). O escritor paulista Osvaldo de Camargo propôs, então, no evento realizado em Salvador, em 1978, a oficialização da data, que passou a ser apoiada pelo movimento.
Em âmbito nacional, o primeiro reconhecimento oficial por parte do Estado ao Dia da Consciência Negra veio por meio da Lei n.º 10.639/2003, sancionada durante o governo Lula, que instituiu a obrigatoriedade do ensino sobre história e cultura afro-brasileira nos ensinos Fundamental e Médio e incluiu a data no calendário escolar. Finalmente, em 2011, na gestão Dilma Rousseff, a Lei n.º 12.519 instituiu o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra em todo o País.
Materiais para educadores
Desde ontem, o CENPEC tem realizado, nas redes sociais, a divulgação de uma série de materiais sobre cultura afro-brasileira, para dar suporte a professores e educadores interessados em abordar o assunto e em apoio à Lei n.º 10.639.
A primeira postagem trouxe uma série de oficinas disponibilizadas pela plataforma Educação e Participação. Até o dia 24, estão previstos especiais do Canal Futura, um livro editado pelo Ministério da Educação sobre história da África, além de artigos e entrevistas (com Esdras Soares, por exemplo).
Os materiais podem ser consultados nos perfis do CENPEC no Facebook, Twitter e Instagram. Acompanhe e compartilhe com as hashtags #SemanaDaConsciênciaNegra e #CulturaAfroBrasileira.
CAMPOS, D. M. C. O Grupo Palmares (1971-1978): um movimento negro de subversão e resistência pela construção de um novo espaço social e simbólico. 2006. 196 f. Dissertação (Mestrado em História). Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2006. Disponível em: http://repositorio.pucrs.br/dspace/handle/10923/3984. Acesso em: 19 nov. 2018.
Foto de destaque: Homenagens junto ao Monumento a Zumbi dos Palmares, na região central do Rio de Janeiro (RJ). Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil. Compartilhada sob licença Creative Commons Attribution 2.0 Generic.
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