Os dados sobre a
qualidade da aprendizagem no Brasil ocultam um tipo mais sutil de desigualdade
educacional que se vem produzindo em toda a educação básica: a desigualdade de
aprendizagem entre grupos sociais.
O diagnóstico é de Maria Alice Setubal (foto em destaque), presidente do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife) e do conselho da Fundação Tide Setubal; José Francisco Soares, professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE); e Maurício Érnica, professor da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Maria Alice é também conselheira do CENPEC Educação.
Avanços e desafios
Intitulado “Qualidade para poucos não é qualidade”, o artigo, publicado no jornal Folha de S. Paulo, inicia relatando os avanços que o Brasil alcançou na educação básica. “Em 1980, apenas 25% das crianças brasileiras chegaram à oitava série (…). Hoje, praticamente universalizamos o Ensino Fundamental e ampliamos muito a taxa de matrículas na educação infantil e no Ensino Médio”.
No entanto, após a
ampliação da cobertura – primeiro obstáculo a ser vencido –, o Brasil pôs a
qualidade no centro do debate a partir da década de 1990, especialmente
mediante metas baseadas no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb),
que revelaram desigualdades no acesso e na conclusão das etapas da
escolarização básica, deslocando os desafios para os anos finais do Ensino
Fundamental e para o Ensino Médio.
“A qualidade da aprendizagem melhorou de modo expressivo nos anos iniciais do Ensino Fundamental, embora nos finais o avanço tenha sido menor e, no Ensino Médio, quase não tenha havido progresso”, diz o texto, que introduz, então, seu foco principal: apesar do retrato bastante conhecido desses desafios, há a desigualdade entre grupos sociais, que tem sido pouco abordada.
Segundo Setubal, Soares
e Érnica, a média nacional em língua portuguesa na Prova Brasil no quinto ano
subiu quase 40 pontos, de 173 para 210, entre 2007 e 2010. “Contudo a evolução
da média foi produzida pela progressão maior dos resultados dos grupos em
posição de vantagem na escola pública: os de maior nível socioeconômico e os
brancos, que aumentaram sua vantagem sobre os de menor nível socioeconômico e
os pretos, respectivamente”, diz o artigo.
Por conta dessa desigualdade que aparece entre grupos sociais distintos, foi criado o Indicador de Desigualdades e Aprendizagens (IDeA), que, segundo os autores, “oferece, para todos os municípios brasileiros, um retrato do nível de aprendizagem atingida pelos seus estudantes da educação básica e das desigualdades entre grupos sociais que existem dentro deles”.
O IDeA e as desigualdades entre grupos sociais
Para os autores do texto, o IDeA torna visíveis essas novas formas de desigualdade educacional.
[O IDeA] mostra que são abundantes as situações que o País não pode aceitar: muitos municípios em situação de equidade, mas com baixo nível de aprendizagem, e muitos municípios com alto nível de aprendizagem, mas com desigualdades pronunciadas. Mostra, ainda, a escassez do que é desejável e deve ser direito de todos: alto nível de aprendizagem e equidade.”
Maria Alice Setubal, José Francisco Soares e Maurício Érnica
O IDeA foi lançado no Seminário Democracia, educação e equidade: uma agenda para todos, promovido em junho pela Fundação Tide Setubal, Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) e pela representação da UNESCO no Brasil.
Presente ao evento, Anna Helena Altenfelder, presidente do Conselho de Administração do CENPEC Educação, analisou a importância do indicador: “Ele aponta que, num município com Ideb alto, por exemplo (…), pode ocorrer de meninos negros aprenderem menos que meninos brancos, por uma série de questões sociais e de raça, fato que não se pode permitir e precisa ser combatido”.
Podemos admitir diferenças, desde que elas não tenham marcas de grupos raciais, gênero ou nível socioeconômico.”
Anna Helena Altenfelder
Sobre o IDeA
o IDeA se concentra na aprendizagem dos estudantes que concluíram a primeira e a segunda etapas do Ensino Fundamental (5º e 9º anos) nos municípios brasileiros.
Ele evidencia situações de baixo nível de aprendizagem e de desigualdades para que essas duas dimensões do direito à educação de qualidade sejam assumidas como problemas sociais e se tornem objeto de ações transformadoras pelos formuladores de políticas, gestores públicos, a comunidade da educação e a sociedade como um todo.
A concepção se baseou nos dados públicos das edições da Prova Brasil, de 2007 a 2015, que mede desempenhos em língua portuguesa e matemática, para estabelecer referências de aprendizado, comparando-se o desempenho dos estudantes brasileiros com aqueles dos países da OCDE.
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