Direitos humanos e cultura de paz: como abordar na escola?
Como trabalhar temas como guerras e conflitos armados com as(os) estudantes? Confira dicas de conteúdos
Por Stephanie Kim Abe
Há quase duas semanas, a guerra na Ucrânia tem tomado os noticiários do Brasil e do mundo. São notícias sobre os ataques, os incidentes que levaram à guerra, as consequências econômicas e políticas do conflito, as análises sobre o futuro da guerra, as suas implicâncias para o Brasil e a vida das(os) brasileiras(os) etc. E, claro, as implicações humanitárias da guerra.
Desde que a Rússia lançou os primeiros mísseis e bombas sobre alvos militares nas cidades de Kiev e Kharkiv, em território ucraniano, no dia 24 de fevereiro, 1,3 milhões de pessoas já fugiram do país para países vizinhos, de acordo com o Unicef e a Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR). Dentre essa população, já são contabilizadas mais de meio milhão de crianças e adolescentes que foram forçados a deixar a Ucrânia.
Em meio a esse cenário de incerteza e tristeza, há muitos assuntos que podem chamar atenção das(os) estudantes. Eles podem ser ponto de partida para conversar sobre direitos humanos, situação das(os) refugiadas(os) no mundo, conflitos armados, defesa de territórios, importância do diálogo e da valorização de diferentes culturas etc.
Infância, juventude, literatura e guerras cotidianas
Sobre o tema da guerra, ou guerrilha, em seu país, Colômbia, a educadora e escritora Yolanda Reyes escreveu um tocante ensaio, intitulado “Escrever para os jovens na Colômbia”. Nesse texto, Yolanda conta da sua experiência na relação com crianças e jovens, em seu ofício de autora e promotora de leitura, e como a literatura pode ser um caminho para lidar com a violência e a morte presentes no cotidiano.
A seguir, reproduzimos um trecho deste ensaio, que foi publicado no Brasil pela editora Pulo do Gato no livro Ler e brincar, tecer e cantar – Literatura, escrita e educação:
“… a palavra guerra não tem em meu país esse toque grandiloquente de epopeia, com fanfarras, exércitos, campos de batalha, muito menos com uma data de início de outra de fim, como as que temos em nossos livros de história de colégio: não estou falando de uma guerra de filme, nem de livro. É mais: seguramente aqueles que estiveram em lugares distintos da Colômbia podem ter-se perguntado onde ela está, pois se mescla com um toque de normalidade, de vida cotidiana, em meio a certa crispação que circula no ambiente, mas que é inapreensível e inefável (posto que não se nomeia na linguagem).
[…] Por seu poder de explorar o melhor e o pior da nossa condição, a literatura nos traz outras notícias, do fundo de nós mesmos, e nos conecta com sentimentos que todos compartilhamos, sem importar de que lado do muro estamos, de que lado do oceano. Essa experiência imaginária de viver na pele dos outros […] pode ser o começo de uma longa conversação com as crianças, que tanto estão precisando de outras versões, distintas das que reproduzem diariamente as notícias.”(Yolanda Reyes)
Abaixo, o Portal Cenpec selecionou alguns de seus conteúdos sobre esses diferentes temas que podem ajudar educadoras(es) a pensarem estratégias e gerar conversas com sua turma sobre essas diversas temáticas. Há dicas de oficinas, artigos, reportagens, materiais audiovisuais etc.
Confira!
Oficinas
Mudar o mundo é preciso
Neste exercício lúdico, a ideia é transforma a realidade com a imaginação e a expressão, no sentido de desenvolver valores e comportamentos solidários e a compreensão de que a realidade é mutável. Espera-se que as crianças aprendam que miséria, fome e violência não são naturais, ao contrário: são problemas sociais que devem ser combatidos. E para isso é importante contar com a ajuda de outras pessoas e pensar soluções coletivas que promovam outras possibilidades de viver e compartilhar o planeta.
Em um processo de pesquisa e reflexão sobre as diferentes origens do povo brasileiro, essa atividade convida as(os) estudantes a compreenderem que nós, seres humanos, somos todos imigrantes de certa forma, e que é preciso respeitar as outras nacionalidades, etnias e culturas, e conviver, dialogar e valorizar a diversidade e a pluralidade.
Essas crianças ucranianas, infelizmente, fazem parte de um universo de cerca de 65 milhões de crianças e jovens no mundo todo que vivem como refugiados ou como migrantes, fugindo de guerras, da pobreza ou de condições ambientais inóspitas.
Para tratar do assunto, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) lançou, em 2016, a campanha global #actofhumanity (Ato de Humanidade), da qual faz parte a série de animação Contos que não são de fadas. São três animações baseadas em narrativas reais de crianças refugiadas, que revelam como elas se sentem por serem obrigadas a abandonar a terra natal e viver em outro lugar, sem amigos nem conhecidos.
Nesta reportagem, contamos um pouco do histórico que levou à aprovação, em 10 de dezembro de 1948, da Declaração Universal dos Direitos Humanos na ONU e trazemos reflexões sobre os rumos da educação brasileira nesse contexto.
Educação em direitos humanos: práticas educativas nas escolas
Você sabia que, desde 2003, o Brasil tem um Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos? O documento foi lançado para fortalecer o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais e promover o pleno desenvolvimento da dignidade humana, construindo uma cultura de paz.
Mesmo sem políticas públicas que norteiem essas iniciativas, há muitos(as) educadores(as) trazendo esse importante tema para a sala de aula. Nesta reportagem, trazemos relatos de experiência de alguns(as) educadores(as) brasileiros(as) que tratam da temática em sala de aula.
Infâncias na escola: brincar, socializar, fazer arte, reconciliar valores
Como incentivar a cultura de paz com as crianças? Quais valores podemos incentivar com diferentes brincadeiras e atividades?
Aproveitando a Semana da Infância e Cultura da Paz (SPAZ), promovida pela Aliança pela Infância – que buscou mobilizar organizações, escolas, comunidades, ativistas, famílias sobre a importância do brincar e da infância na perspectiva da cultura de paz e da não violência – o Portal Cenpec trouxe especialistas para discorrer sobre quais práticas escolares podem ser prioritárias para atenuar as privações e os impactos causados pela pandemia nas crianças.
Neste artigo, Fabio José Cardias-Gomes (UFMA) traz reflexões sobre a importância de olhar para a degradação e apropriação dos povos originários, a partir de sua participação no Terceiro Congresso Internacional dos Povos Indígenas da América Latina (Cipial).
“Mas, há pressa sim, e muita, muita pressa na proteção de suas terras, territórios ou territoriedades, incluindo alimentação e água fresca, nascentes. Já extinguimos, a nossa espécie, sobre a Terra, mais de 70% de outras, inclusive outros homo sapiens. Há pressa demais em reverter, parar ou se conscientizar de que nosso projeto civilizatório é uma mentira absurda, baseada em um consumismo desenfreado, que destrói a natureza”, diz o pesquisador e professor.
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