Hiperatividade, déficit de atenção, indisciplina, apatia, ansiedade, depressão… Termos como esses estão cada vez mais presentes na pauta da mídia, nas salas de aula e no ambiente familiar. O que comportamentos tão discutidos e rotulados na sociedade nos dizem a respeito de parcela da população crescentemente atingida por eles: crianças, adolescentes e jovens?
Em sua última edição, a revista Desidades, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), traz contribuições de psicanalistas do Brasil, Argentina e Chile, convidados a compartilhar experiências, intervenções e análises sobre o sofrimento psíquico de jovens e crianças no contexto contemporâneo da América Latina.
O risco da patologização e consequente medicalização da existência ganha contornos mais preocupantes no que concerne às crianças e jovens. Se tomarmos os problemas de aprendizagem que crianças apresentam na escola como sintomas que se mostram como resposta do sujeito, não cabe o tratamento a ser oferecido, ser aquele que comporte a adaptação ou apagamento dessa resposta. Se ater ao imperativo da demanda da criança ideal, do jovem adaptado, implica no risco de se apagar o essencial, isto é, o lugar do sujeito.”
Renata Alves de Paula Monteiro e Sonia Borges Cardoso de Oliveira
A reflexão acima, das autoras do prefácio à edição 22, coloca o dedo em uma ferida pulsante para todos aqueles que se interessam pelos temas da educação e da infância e adolescência. Como afirmam as pesquisadoras:
Mais do que uma posição alarmista ou epidêmica, esta edição teve como objetivo principal promover a discussão sobre questões que nos cercam, seja em nosso âmbito familiar, seja enquanto profissionais, mas no convite a que possamos avançar e dar lugar ao que acontece hoje, sem cairmos no perigo de uma posição saudosista.”
Renata Alves de Paula Monteiro e Sonia Borges Cardoso de Oliveira
Antes de mais nada, os textos presentes na publicação ressaltam a importância da escuta desses sujeitos, incitando os adultos, sejam os responsáveis, sejam os professores, sejam os terapeutas, a “levar a sério a fala dos jovens”.
Com base nas palavras do psiquiatra e psicanalista Edson Saggese, entrevistado da seção “Espaço Aberto” da revista (p. 51 a 62), podemos refletir que aquilo se naturalizou como distúrbio pode ser visto de uma perspectiva muito mais ampla do que de uma ótica individualista. O sofrimento e a inadequação manifestas por crianças e jovens diante das demandas sociais de nossa civilidade podem nos dar pistas de caminhos a serem construídos em busca de novas formas humanas de viver a singularidade no coletivo.
Tanto do ponto de vista de que adolescer se torna algo mais difícil, ao mesmo tempo, isso não é um discurso absolutamente pessimista, porque se é mais difícil, também é um sinal de que nós atravessamos dificuldades no nosso processo civilizatório e a resposta virá dos jovens. A resposta não virá do passado.”
Sobre a revista
Desidades é uma revista eletrônica de divulgação científica na área da infância e juventude. De publicação trimestral, avaliada por pares, do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC), da UFRJ.
O neologismo desidades, que intitula a revista, foi escolhido para refletir a ideia de que as idades, como critérios fixos que naturalizam comportamentos, habilidades e modos de existência, precisam ser problematizadas para permitir novas abordagens e diálogos sobre as relações entre gerações.
Tem como público-alvo não só acadêmicos, mas também estudantes de pós-graduação e graduação, profissionais que trabalham com infância e juventude e demais interessados em refletir sobre os desafios e as dificuldades de ser criança ou jovem no contexto das sociedades atuais, especialmente no espaço latino-americano.
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